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Arrastão: Os suspeitos do costume.

Um economista de combate no Negócios

João Rodrigues, 14.09.10


“O centro de investigação 'Research on Money and Finance' (RMF), sediado em Londres, lançou na sexta-feira o relatório 'Eurozone Between Austerity and Default', onde analisa os impactos das actuais políticas de austeridade na Zona Euro. Nuno Teles, um economista português que faz parte do RMF, respondeu por email às questões colocadas pelo Negócios acerca dos resultados.

Num cenário de implementação dos planos de austeridade, quais as consequências económicas para a Zona Euro?

Com um sector financeiro muito frágil e um ambiente externo marcado pela incerteza e pela instabilidade, os actuais planos de cortes da despesa pública, dos benefícios sociais, a compressão salarial e a liberalização do mercado de trabalho tornam um cenário de contracção do PIB, de aumento do desemprego e de deflação salarial como o mais provável para a Zona Euro.

No que é que Portugal se distingue dos restantes países da periferia, e como é que se espera que seja afectado em 2011?

A primeira grande diferença é que Portugal, ao contrário da Grécia e de Espanha, sofreu de uma estagnação económica na última década que nos coloca numa posição mais frágil. Em segundo lugar, Portugal tem uma dívida externa superior (233% do PIB, contra 169% do PIB em Espanha e 162% do PIB na Grécia), com destaque para a do sector privado. Aqui, vale a pena chamar a atenção para o facto de o endividamento das empresas não financeiras ser maior do que o das famílias. O problema é, pois, estrutural à economia nacional, e não um mero reflexo da irresponsabilidade financeira dos portugueses ou do Estado, como tem sido amiúde caracterizada a nossa situação. A brutal redução do défice público tem de ter como contrapartida um aumento do endividamento privado. Mas sabemos que este dificilmente ocorrerá (ironicamente, talvez seja por isto que os bancos promovam a redução do défice público). A corda vai ter que partir por algum lado.

Dada a situação económica e financeira nacional, faria sentido implementar e negociar um sistema de incumprimento da dívida?

As incertezas sobre o pacote de salvamento europeu são várias. O incumprimento grego parece inevitável face à contracção do PIB prevista este ano e no próximo. Em caso de “default” grego, Portugal e Espanha deverão seguir o mesmo comportamento, dados os efeitos de contágio nos mercados. A questão que se coloca é como tal processo será conduzido. Haveria vantagem em que o processo fosse antecipado pelos devedores, beneficiando da sua posição de poder face a bancos frágeis na Europa com muito a perder. Neste caso, os países em dificuldades poderiam ganhar espaço de manobra para uma real recuperação económica. Este processo passaria necessariamente por uma auditoria à dívida pública e uma renegociação transparente.

Dadas as consequências que daí adviriam, possivelmente uma exclusão dos mercados internacionais e uma machadada na credibilidade, como se pode garantir que essa opção não seria pior?

Estas opções têm, obviamente, riscos, mas o actual rumo não é sustentável. Os problemas estruturais de perda de competitividade das economias periféricas não parecem abrandar. Segundo a Comissão Europeia, mesmo com a compressão salarial destes países, economias como a alemã continuarão a ser as campeãs da redução dos custos unitários nominais de trabalho. A questão da desagregação do euro deve ser considerada. Os países poderiam assim desvalorizar as suas moedas e melhorar a sua competitividade externa. Esta opção teria de ser acompanhada da introdução de controlos de capitais e do controlo público do sistema financeiro, cujas dívidas continuariam denominadas em moeda estrangeira. Os recentes exemplos da Argentina e da Rússia mostram que a exclusão dos mercados pode ser de curta duração.

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