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Arrastão: Os suspeitos do costume.

Melhores dias virão

Sérgio Lavos, 31.08.11

 

Confesso que está-me a dar um certo gozo ver o defraudar diário das expectativas criadas por este Governo nos nossos blogues de direita. Os avençados dos gabinetes ministeriais retiraram-se de cena, mas as hordas de abnegados ultraliberais - e alguns conservadores de direita - que exultaram com a subida ao poder da trupe PSD/CDS, começam a não ter paciência para tanto "corte na despesa", e chegam a ameaçar com "tabefes" e "adesões ao partido comunista" como retaliação à desorientação governativa. A rábula protagonizada, à vez, pela dupla de economistas estrangeirados Álvaro e Vítor "Astromar" - um titilante anúncio, em forma de comunicado de imprensa, de brutais cortes na despesa, que redunda, alguns dias depois, em conferência de imprensa na qual são anunciados aumentos de impostos - é um tratado de governação como nunca se tinha visto em Portugal. Se juntarmos a esta brincadeira as patuscas medidas da facção CDS do Governo - ora se promove a informalidade nos gabinetes ora se anuncia um aumento do número de vagas nas creches reduzindo o espaço das salas, medidas de fundo que irão mudar a sociedade e o mundo - temos e teremos regabofe quase diário. E o desespero crescente dos alucinados que sonhavam com um risonho futuro, um capitalismo em roda livre, com impostos ao nível do Liechtenstein e áreas fundamentais da economia entregues aos empresários corporativistas do nosso canto, parece não ter fim, como a tristeza.

 

Contudo, deixo aqui uma palavra de esperança neste momento difícil: nada está perdido. Pois se hoje o Governo aumenta os impostos - sacanas, 2.5% para os pobres que ganham mais de 5 mil euros! Onde já se viu? - há uma promessa de novos amanhãs que cantam: a RTP, as Águas de Portugal, a EDP, a CP, a TAP e tantos outros tesouros serão os prémios para quem souber resistir a estes tempos difíceis. Erguei os braços ao céu, e o céu vos responderá. É tudo uma questão de tempo. E paciência.

 

(Imagem retirada daqui.)

Passe social: a cegueira do mau contabilista

Daniel Oliveira, 31.08.11

 

Há duas formas de apresentar o novo passe social que se terá de pedinchar com um atestado de pobreza. Uma é dizer que foi criado um passe para pobres, mais barato. Outra é dizer que os custos dos transportes públicos - mais usados pelos mais pobres e os que vivem nas periferias - foram brutalmente aumentados e ficaram de fora do saque alguns miseráveis. Apenas os que recebem menos de 545 euros brutos. E, destes, apenas uma pequena parte (nem todas as combinações de trajetos estão garantidas). Ou seja, o passe é, na realidade, um apoio social para uma pequeníssima parte dos portugueses. Mas um mês depois do governo tirar com uma mão a todos faz uma festa com as migalhas que dá a quase ninguém. E dá, a esta propaganda descarada, o nome de "Programa de Emergência Social".

 

Quando o passe social foi criando, importando as melhores práticas da maioria dos países europeus, não correspondia apenas a uma medida social. Era, acima de tudo, uma medida racional. Garantir a mobilidade promovendo o uso generalizado do transporte público. Porque o transporte público é melhor para a qualidade vida nas cidades, para a economia dos países e para as finanças do Estado.

 

Depois veio o deslumbramento novo rico. Andar de carro era sinal de desenvolvimento. O dinheiro público foi quase exclusivamente canalizado para o transporte individual, como prova o investimento desajustado em autoestradas e o desmantelamento da já ridícula rede ferroviária. A privatização a retalho da Rodoviária Nacional e a concessão de linhas ferroviárias a privados levou à lenta agonia do passe social - mais por incapacidade de coordenação entre operadores, para a qual a inexistência de verdadeiras autoridades urbanas de transportes contribuiu, do que por qualquer opção política - e à sua substituição por passes combinados. Ao contrário do que se passa em muitas cidades europeias, multiplicam-se os títulos de transporte, não havendo qualquer coordenação tarifária ou mesmo de percursos. Resultado: os transportes públicos perderam centenas de milhares de passageiros. Lisboa e Porto estão cheios de carros e, tirando as respetivas redes de metro, o uso do transporte público é um quebra cabeças a que só não foge quem não pode.

 

Dirão: não há dinheiro para continuar a pagar o buraco financeiro das empresas de transportes. Os transportes públicos dão o prejuízo que dão porque foram mal geridos e maltratados. E porque o estacionamento em espaço público nas cidades é um negócio em vez de servir para financiar, como deveria acontecer, os transportes coletivos.

 

Mas o mais importante é perceber que o que se poupa agora se vai gastar em muito mais. A diferença é que não aparece nas contas de nenhuma empresa pública. Vamos pagar em importação de combustíveis (e reduzir as importações deveria ser uma das nossas prioridades). Vamos pagar em degradação do espaço público que, caso ninguém se recorde, tem de ser mantido e essa manutenção tem custos. Vamos pagar em produtividade.

 

Dirão: mas com o custo de vida as pessoas também não vão usar o transporte individual. E aí vão trabalhar como? Ou o empregador lhes paga o transporte que agora é mais caro - mais custos associados ao trabalho - ou o trabalhador fica com menos rendimento disponível. E a pergunta que sobra é esta: está o governo à procura do equilíbrio a partir do qual deixa de valer a pena trabalhar para parar aí, mantendo a maioria dos cidadãos com emprego abaixo do limiar da pobreza?

 

O problema deste governo é que não vê o Estado como um coordenador de políticas para nos tirar de uma crise. O seu programa resume-se a reduzir a despesa do Estado sem se dar ao trabalho de pensar nas consequências económicas de cada medida. Não percebendo que, com o nosso endividamento externo e a nossa falta de crescimento, se limita a cumprir metas, agravando o problema para o futuro.

 

Volto ao princípio: o passe social, assim como tudo o que esteja associado à rede de transportes públicos, é um instrumento. Ele é fundamental para o bom funcionamento das cidades e das suas economias. Ele é fundamental para reduzir a nossa dependência energética, reduzir o tempo em deslocações e aumentar a produtividade. Nem apelo a qualquer tipo de sensibilidade social, que já se percebeu que para este governo se resume a dar esmolas a miseráveis que rendam umas notícias nos jornais. Pergunto apenas: acham que a nossa economia aguenta ser tão maltratada? Quando já nada funcionar poderiam até vir a dizer: temos as contas públicas limpas. Sem economia, vivendo no meio do caos, não serviria de muito. Acontece que sem crescimento económico não há finanças do Estado que se aguentem. E quando já não houver mais nada para cortar, nem mais "Estado gordo" para culpar, vão fazer o quê?

 

Publicado no Expresso Online

Continuar a mimar os super-ricos

Pedro Sales, 31.08.11

 

Nestes últimos dias temos assistido a um espectáculo altamente pedagógico. Mal se começou a falar na possibilidade de um "imposto para os mais ricos" e logo começou o corrupio nos canais de notícias, editoriais e colunas de opinião para defender que nem pensar, onde é que já se viu tamanha aventura.

 

Os mesmos nomes que, quase sem excepção, defenderam a necessidade de aumentar os impostos sobre o trabalho e consumo em nome do sacrifício colectivo para equilibrar as contas públicas, avisam-nos agora dos riscos inerente à tributação dos mais ricos. Ele é o aumento da carga fiscal, que apenas serve para alimentar o monstro e o despesismo do Estado, ou uma forma fácil e demagógica de arrecadar receita. Enfim, o típico exemplo de um debate ideológico sem sentido.

 

Um deputado do CDS, que ainda há poucas semanas defendia o corte de metade do subsídio de natal aos afortunados que ganham mais de 485 euros, diz agora que “não me parece que se possa ultrapassar aquele limite de sacrifícios que se deve pedir aos portugueses”...a propósito do imposto sobre as heranças. Cavaco Silva, esse, desdobra-se na defesa de uma miríade de novos impostos para aumentar o ruído e garantir que, colocando todos a falar de coisas diferentes, não se chega a lado nenhum.

 

Nos canais de notícias o fenómeno é ainda mais visível. Os que não foram para a bancada do PSD já foram substituídos por iguais devotos, quase sempre  fiscalistas ou ligados profissionalmente ao sector financeiro, que fazem o favor de explicar à turba como a tributação do capital pode ser prejudicial para todos - incluindo quem menos tem e teve que pagar o imposto extraordinário que isentou lucros e capital.

 

Enquanto, em nome do combate ao défice, se foi aumentando impostos sobre o trabalho, transportes, taxas moderadoras e afins tudo estava bem. Era difícil mas necessário. Até que chegou o dia em que alguém se lembrou mudar o guião e falar nos rendimentos que têm estado ausentes do tal "esforço colectivo". Aí começaram as esquivas, as tácticas de diversão e os sucessivos problemas que uma medida destas originaria. Como ia dizendo, este debate tem sido mesmo muito pedagógico.

 

(imagem animada retirada daqui

Portugal 61

Miguel Cardina, 30.08.11

 

Leio Angola 61. Guerra Colonial: Causas e Consequências. O 4 de Fevereiro e o 15 de Março, da autoria de Dalila Cabrita Mateus e Álvaro Mateus. É um impressionante documento centrado nos momentos que dão corpo ao início da guerra naquele território: o 4 de Fevereiro e o 15 de Março, mas também a revolta camponesa na Baixa de Cassange. Assumindo o colonialismo como forma genérica de inferiorização - o que lhes permite um olhar bastante agudo sobre algumas dimensões do fenómeno - os autores também efectuam uma análise de como a experiência da guerra se entrelaçou com o estertor do regime. O uso cuidado das fontes, recorrendo a vários arquivos e a depoimentos escritos e orais sobre os episódios, não os inibe de guardar as últimas linhas para uma curiosa interpelação de outra índole. Pergunta-se então: como teria sido a descolonização se em vez da guerra se tivesse optado pela negociação? Como seria hoje o país se não tivéssemos embarcado numa via que delapidou tantas vidas (só do lado português, mais de 8.000 mortos, 30.000 feridos e um número não contabilizado de gente afectada psicologicamente) e recursos materiais (com os gastos de guerra a assumirem 40% das despesas do Estado)? Perguntas que ficam sem resposta porque a função do livro é outra. Mas que de repente nos lembram a importância destes exercícios de imaginação histórica e de como estamos tão pouco habituados a fazê-los. Infelizmente.

Se não saltarem nem espreguiçarem, onde cabem 10 cabem 14

Pedro Sales, 30.08.11

Os ricos que também paguem um pouco da crise

Daniel Oliveira, 30.08.11

 

Os mais pobres dos mais pobres já pagaram. Com os cortes nos apoios sociais, o aumento do IVA e o aumento dos transportes, da eletricidade e do gás. Os pobres um pouco menos pobres já pagaram. Com o tudo o que já referi e o imposto extraordinário sobre o subsídio de Natal, recebam ou não recebam subsídio de Natal. A classe média já pagou. Com tudo o que já referi e o aumento do IMI, dos juros e dos spreads. A classe média alta já pagou. Com tudo o que já referi e a criação de um novo escalão de IRS.

 

Umas medidas são justas, outras injustas, mas a verdade é que tocou a todos. A todos? Não, a quase todos. Quando se decidiu criar o tal imposto extraordinário deixou-se de fora a distribuição de dividendos. Agora, que se fala da criação de um imposto "para ricos", pensa-se deixar de fora o património, taxando apenas o rendimento do trabalho. Ora, a taxação sobre os rendimentos do trabalho apanha apenas os quadros superiores e o profissionais liberais. Deixar de fora o património no "imposto para os ricos", como deixar de fora a distribuição de dividendos no imposto de Natal, é isentar apenas uma pequeníssima parte dos portugueses do sacrifício geral: os que são realmente ricos, que pouco declaram em sede de IRS. E mesmo que haja imposto sobre o património, ele deve ter um teto razoável, para serem apenas os que têm ficado a salvo dos sacrifícios a pagar.

 

Não se trata de roubar ninguém. Não se trata sequer de dizer que devem ser os ricos a pagar a crise. Trata-se de repetir o que disse Warren Buffet, um dos homens mais ricos do mundo: parem de mimar os ricos. Mesmo sabendo que Américo Amorim é apenas, nas suas palavras, "um trabalhador". Já nem se trata de distribuir os sacrifícios conforme as possibilidades de cada um. É apenas não deixar de fora os únicos a quem a crise não toca. Já nem se pode falar de justiça. Apenas de vergonha na cara. Não é nada contra os ricos. É apenas para abrandar um pouco o saque geral a todos os outros. Ficam zangados? O resto dos portugueses também têm ficado. Sobretudo por saber que trabalhar e receber por isso parece ser o único pecado que não se perdoa neste País.

 

Publicado no Expresso Online

Vem aí o 15 de Outubro

Miguel Cardina, 29.08.11

 

PROTESTO APARTIDÁRIO, LAICO E PACÍFICO

− Pela Democracia participativa.
− Pela transparência nas decisões políticas.
− Pelo fim da precariedade de vida.

Somos “gerações à rasca”, pessoas que trabalham, precárias, desempregadas ou em vias de despedimento, estudantes, migrantes e reformadas, insatisfeitas com as nossas condições de vida.
Hoje vimos para a rua, na Europa e no Mundo, de forma não violenta, expressar a nossa indignação e protesto face ao actual modelo de governação política, económica e social. Um modelo que não nos serve, que nos oprime e não nos representa.

A actual governação assenta numa falsa democracia em que as decisões estão restritas às salas fechadas dos parlamentos, gabinetes ministeriais e instâncias internacionais. Um sistema sem qualquer tipo de controlo cidadão, refém de um modelo económico-financeiro, sem preocupações sociais ou ambientais e que fomenta as desigualdades, a pobreza e a perda de direitos à escala global. Democracia não é isto!

Queremos uma Democracia participativa, onde as pessoas possam intervir activa e efectivamente nas decisões. Uma Democracia em que o exercício dos cargos públicos seja baseado na integridade e defesa do interesse e bem-estar comuns.

Queremos uma Democracia onde os mais ricos não sejam protegidos por regimes de excepção.
Queremos um sistema fiscal progressivo e transparente, onde a riqueza seja justamente distribuída e a segurança social não seja descapitalizada; onde todas as pessoas contribuam de forma justa e imparcial e os direitos e deveres dos cidadãos estejam assegurados.

Queremos uma Democracia onde quem comete abuso de poder e crimes económicos e financeiros seja efectivamente responsabilizado por um sistema judicial independente, menos burocrático e sem dualidade de critérios. Uma Democracia onde políticas estruturantes não sejam adoptadas sem esclarecimento e participação activa das pessoas. Não tomamos a crise como inevitável. Exigimos saber de que forma chegámos a esta recessão, a quem devemos o quê e sob que condições.

As pessoas não são descartáveis, nem podem estar dependentes da especulação de mercados bolsistas e de interesses financeiros que as reduzem à condição de mercadorias. O princípio constitucional conquistado a 25 de Abril de 1974 e consagrado em todo o mundo democrático de
que a economia se deve subordinar aos interesses gerais da sociedade é totalmente pervertido pela imposição de medidas, como as do programa da troika, que conduzem à perda de direitos laborais, ao desmantelamento da saúde, do ensino público e da cultura com argumentos economicistas.

Os recursos naturais como a água, bem como os sectores estratégicos, são bens públicos não privatizáveis. Uma Democracia abandona o seu futuro quando o trabalho, educação, saúde, habitação, cultura e bem-estar são tidos apenas como regalias de alguns ou privatizados sem que daí advenha qualquer benefício para as pessoas.

A qualidade de uma Democracia mede-se pela forma como trata as pessoas que a integram.
Isto não tem que ser assim! Em Portugal e no mundo, dia 15 de Outubro dizemos basta!

A Democracia sai à rua. E nós saímos com ela.


Organizações subscritoras

Acampada Lisboa – Democracia Verdadeira Já 19M
Alvorada Ribatejo
Attac Portugal
Indignados Lisboa
M12M – Movimento 12 de Março
Movimento de Professores e Educadores 3R’s
Portugal Uncut
Precários Inflexíveis

Não é um, não são dois, mas sim três, três grupos de trabalho de uma assentada

Sérgio Lavos, 29.08.11

O ministro Miguel Relvas, para além de ser campeão no recrutamento de assessores, parece também querer intervir em força numa das áreas mais necessitadas da nossa economia: o futebol. E lá vão três grupos de trabalho de uma vez. Ora toma, haja quem dê o exemplo e meta as mãos na massa, rapidamente e em força.

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