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Arrastão: Os suspeitos do costume.

Corporações

Sérgio Lavos, 29.06.13

Irmão de presidente da Optimus indicado para liderar a AdC.

 

Num país em que são privatizadas empresas públicas que têm lucro com o pretexto de liberalização dos mercados, na prática entregando-se monopólios naturais a lucros privados, sem que os consumidores sintam os resultados dessa liberalização, é natural que se entregue a supervisão da concorrência a um familiar do principal administrador da empresa que está a ser supervisionada.

 

Na realidade, as leis do mercado não se aplicam a determinados sectores da economia. A liberalização do mercado e o fim do controlo estatal do preço dos combustíveis levou a que, em dez anos, Portugal tenha dos preços mais elevados da OCDE; a liberalização do fornecimento de electricidade e de gás natural está a ter exactamente o mesmo efeito - a privatização da EDP contribuiu para que, em dois anos, a factura de electricidade tenha aumentado exponencialmente para a generalidade das famílias e das empresas; e a concorrência entre empresas de comunicações é uma farsa - basta ser um consumidor atento para se perceber a concertação de preços e de serviços, que leva a que paguemos muito mais do que média da OCDE por serviços telefónicos e Internet, sendo a qualidade bastante inferior à média. 

 

A principal lei do capitalismo - a da oferta e da procura - não funciona. Em Portugal, quanto mais oferta existe, mais os preços sobem para o consumidor. Muitas vezes, com pior qualidade. E os sucessivos Governos estimulam e alimentam as corporações que beneficiam deste crony capitalism. O melhor dos mundos é este.

"2013 será o ano da inversão económica" - Pedro Passos Coelho, em Agosto passado, na festa do Pontal

Sérgio Lavos, 28.06.13

Défice de 10,6%, superior ao que Portugal tinha antes da chamada da troika. E, vá lá, ligeiramente superior aos 5,5% de meta para 2013. E pertíssimo dos 7,9% de défice de 2012. Isto com mais 450 000 desempregados do que em 2011, 8 trimestres consecutivos de recessão, dívida pública quase nos 130%, mais 20% do que em 2011. Mas Pedro Passos Coelho garante que no último trimestre do ano é que vai ser, que vai haver uma "viragem da tendência económica". E o secretário de Estado do Orçamento fala mesmo em "sucesso do programa de ajustamento", evocando um célebre ministro da propaganda de Saddam Hussein que, como o exército dos EUA às portas de Bagdad, clamava pela iminente vitória das forças iraquianas.

 

Mas, enfim, haverá razões para duvidar de tal optimismo realismo? Claro que não! Com o corte de 4700 milhões que se avizinha é que a economia vai florescer, como flor no deserto depois da chuva. Tudo está a correr pelo melhor, é este o bonito ajustamento: o país destruído, milhões de portugueses na pobreza e o equilíbrio das contas públicas - recorde-se, a principal razão para a tomada de poder deste Governo - tornando-se uma miragem cada vez mais longínqua. Agradeçamos a Passos Coelho, Gaspar, Portas e Cavaco, o cartel criminoso que nos governa.

A coragem de quem não trabalhou

Daniel Oliveira, 28.06.13

 

Tudo jogava contra a greve geral. O forte desemprego cria ansiedade e medo de perder o posto de trabalho. As enormes perdas salariais e aumentos de impostos, no público e no privado, não deixam margem para a perda de um dia de salário. Nas pequenas empresas, a situação económica difícil que se vive e o risco de falência tornam mais complicada a decisão de fazer uma greve que não tem como alvo o patrão.

Mesmo na Administração Pública vive-se o pior momento de sempre. As listas de quem vai para a mobilidade (ou ser requalificado, para quem tenha ainda mais dificuldade em pronunciar a palavra "despedimento") já começam a correr. E em muitas empresas do Estado, sobretudo as que se preparam para processos de privatização ou "reestruturações" (outro eufemismo para "despedimento"), os boys do governo há muito espalharam o medo entre os funcionários. A verdade é que já nem no sector público há qualquer sensação de segurança.

 

Passos Coelho reagiu à greve geral como reage a tudo: com frases feitas que acabam por funcionar contra si. Ao repetir a bolorenta frase de que "o país precisa de trabalho, não de greves", deu espaço para que todos se recordassem que, se há alguém que não pode falar do trabalho que o país precisa, é precisamente o primeiro-ministro que mais postos de trabalho destruiu na nossa história recente. E que se prepara, agora na função pública, para engrossar a enorme massa de desempregados que está proibida de contribuir para o crescimento económico do País. É precisamente porque o País precisa de trabalho que Passos Coelho está a mais no lugar que ocupa, responderam, naturalmente, os sindicatos.

 

Nuno Crato deu um fortíssimo argumento à CGTP e à UGT. Quis mostrar a sua força com a greve dos professores e isolá-los. Perdeu. E acabou por ser obrigado a ceder em toda a linha em vésperas de greve geral. Ou seja, toda a gente percebeu que, ao contrário da ideia que se gosta de passar, as greves podem mesmo servir para qualquer coisa. Asdeclarações das três confederações patronais, dizendo que compreendiam esta greve, também foram a demonstração do total isolamento de Pedro Passos Coelho.

 

Claro que a greve foi, por todas as razões que referi (a que se juntam outras, mais antigas, como a crescente precarização das relações laborais e a consequente perda de poder dos sindicatos), muito superior no sector público. E nesse, como se esperava, foi de enormes dimensões. Apesar do spining manhoso da REN, tentando medir a adesão à greve pela comparação do consumo de eletricidade com um feriado em grande parte do País (e não com um dia normal, porque aí a coisa não seria tão boa para o governo), várias grandes empresas de laboração contínua (aquelas onde uma interrupção da produção resulta em maiores prejuízos), como a Autoeuropa e as empresas do seu complexo industrial (responsável por um décimo das nossas exportações), pararam a produção. Adesões superiores a 60% também se verificaram na Central Termoeléctrica de Sines (EDP), Centralcer, Estaleiros Navais de Viana do Castelo, Browning, Lisnave, Amarsul, Eurosinas (Sonae), STEF, Portalex, Unitrato, Renoldy, Visteon, Cobert Telhas, Cerdomus, Sakhit, Tudor, só para pegar em alguns exemplos do que terá, apesar de todas as dificuldades, sido uma das maiores greves gerais no sector privado. Sendo certo que as greves são quase sempre muito fracas no pequeno comércio e serviços, é nas grandes unidades industriais que os seus efeitos económicos são mais significativos.

 

Resumindo: a greve foi enorme no sector público (como se esperava, muito superior ao privado) mas esteve longe de ser uma greve da Função Pública. Segundo a UGT, a greve terá mobilizado mais de metade dos trabalhadores no ativo (em números globais de greve geral não me meto, porque são muito mais do que falíveis, mas foi seguramente superior às duas greves conjuntas anteriores). Isto, apesar de nunca ter sido, no privado e no público, necessária tanta coragem para fazer uma greve.

 

Disse o ministro Marques Guedes que respeita muito quem foi trabalhar. Eu respeito, obviamente, a escolha de todos. Apesar de imaginar que não lhes há de ter sido agradável ser comparados ao governo ("estão a trabalhar como o governo também está", disse o ministro da Presidência). Mas hoje fica aqui o meu respeito para os que, com todos os sacrifícios que estão a viver, com o risco real do desemprego (ou da "requalificação"), perderam um dia de salário e aborreceram os seus patrões e chefes, não indo trabalhar. O País precisa de trabalho, claro está. Mas precisa ainda mais de gente com coragem. Ficou ontem claro que, apesar do discurso das inevitabilidades e do medo, que apelam ao silêncio e à resignação, ainda há muita gente dessa por cá. Resta, por isso, alguma esperança.


PS: Sobre o "não episódio" que envolveu umas poucas dezenas de pessoas nos acessos à Ponte 25 de Abril e que não teve qualquer relevância na greve de ontem, que envolveu centenas de milhares de pessoas, nem perderei tempo. Concorde-se ou discorde-se dela, a greve tem e terá efeitos e leituras políticas (a que voltarei na edição impressa do Expresso). O "não acontecimento" que abriu todos telejornais não sobreviverá na memória de ninguém mais do que umas horas. Deixo, por isso, para as televisões e seus jornalistas a nobre tarefa de hierarquizar as notícias de pernas para o ar, tendo como único critério o que possa dar umas boas imagens de ação (e nem isso deu).


Publicado no Expresso Online

Rossio, 14.30

Daniel Oliveira, 27.06.13

 

 

 

Lisboa: Manifestação a partir das 14:30, Rossio, com partida, às 15:00, para a Assembleia da República.


Santiago do Cacém

Praça do Município

15:00

Moita

Alhos Vedros- Pçª da Republica/Estrada Nacional 11

Baixa da Banheira – Fórum José Manuel Figueiredo/Estada Nacional 11

15:00

15:00

Barreiro

Largo Catarina Eufémia

15:00

O laboratório do saque

Daniel Oliveira, 26.06.13



Reportagem alemã sobre o processo de privatização da distribuição de água em Portugal. Julgam os povos do norte da Europa que estão a salvo. Enganam-se. Nós somos apenas o laboratório de um saque há muito sonhado. Pena que para este assunto ser assunto tenhamos de procurar na comunicação social alemã. (legendado)

Um exemplo para a greve de amanhã

Daniel Oliveira, 26.06.13

Os sindicatos dos professores fizeram mal em exercer o direito greve que, na forma como uma parte razoável dos políticos portugueses o vê, nunca deve ser mais do que simbólico. Fizeram? Pela primeira vez, nos dois últimos anos, o governo sentou-se mesmo à mesa das negociações. Não antes da greve aos exames. Não antes da greve às avaliações. Mas quando se corria  risco de se instalar o caos nas escolas.

 

Apesar de ainda não haver acordo, os professores conseguiram, com as suas greves, a integração de mais medidas que contribuirão para que não haja professores com horário-zero e em risco de ir para "requalificação" (eufemismo para despedimento). Um regime que só se aplicará aos professores a partir de fevereiro de 2015. O limite geográfico para a mobilidade dos professores dos quadros de escola que não tenham serviço letivo passou a ser de 60 quilómetros, tal como acontece com a restante Função Pública. E o governo garantiu que o aumento do horário de trabalho para as 40 horas incidirá apenas na componente não leciva de trabalho individual. Por fim, a direção de turma volta a integrar a componente letiva.

 

Os professores não terão conseguido tudo. Mas conseguiram, pela primeira vez em qualquer confronto com este governo, cedências relevantes. E por isso, a FNE desmarcou as greves e a Fenprof interrompeu-as (com excepção, claro, da greve geral). Para os que, durante o último mês, zurziram nos professores, fica uma importante lição: mostrar indignação no facebook e falar mal dos "políticos" serve de muito pouco se não se está disponível para levar até ao fim, de forma consequente, o confronto. O governo conta com a divisão das pessoas. Desta vez não lhe chegou.

 

Amanhã, há uma greve geral. O exemplo dos professores deve ser, para todos nós, uma inspiração. Solidário com esta greve, não encontrarão no Expresso Online nenhum texto meu.

 

Publicado no Expresso Online

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