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Arrastão: Os suspeitos do costume.

O milagre europeu

Sérgio Lavos, 09.01.14

 

Dois textos que mostram até que ponto tanto o Governo como a União Europeia estão a tentar mudar a narrativa sobre a crise, recorrendo à manipulação de dados e à pura mentira.

 

O primeiro, sobre os dados do desemprego em Portugal, pelo Ricardo Paes Mamede, no Ladrões de Bicicleta: 

"Na sua declaração natalícia, Passos Coelho fez questão de assinalar a criação líquida de 120 mil postos de trabalho entre o 1º e o 3º trimestres de 2013. A selecção do período em análise não é inócua: se tomarmos como referência o início do Memorando e do actual governo (2º trimestre de 2011), a queda do emprego foi, na verdade, superior a 430 mil postos de trabalho; e em termos homólogos (isto é, face a igual período do ano anterior) a queda do emprego foi superior a 100 mil (os dados são do INE). 

 

Mais grave ainda é o tipo de emprego que está aqui em causa. Quando olhamos para a duração da semana de trabalho dos tais 120 mil empregos criados verificamos que o grosso dos novos empregos refere-se a actividades que ocupam entre 1 e 10 horas por semana. Isto não é emprego, é desespero. (...)

 

Pelo contrário, o emprego caiu significativamente para horários mais próximos da duração normal: ao longo de 2013 foram destruídos em termos líquidos mais de 310 mil empregos com duração entre 30 e 40 horas semanais.

O segundo, de Ambrose Evans-Pritchard, colunista do Daily Telegraph, há longo tempo opositor da moeda única e insuspeito de esquerdismo, sobre as declarações de José Manuel Barroso anunciando (mais uma vez) o fim da crise:

"José Manuel Barroso has declared victory again. The European Commission chief tells us that the eurozone crisis is over. The scorched-earth contraction policies have succeeded.

 

Ireland has conducted a "clean exit" and is tapping the bond markets again. Latvia has joined the euro and is now the EU's fastest growing country.

 

"This shows that the programs do work when they are properly implemented," he said.

 

Senhor, it shows no such thing. Ireland is highly competitive (second best in EMU after Finland on the World Bank gauge).

It has an open economy with a trade gearing of 108pc of GDP, giving it three or four times more export leverage than Club Med. It trades heavily with the dollar and sterling zones, now recovering. It has a current account surplus near 4pc of GDP. (...)

 

Mr Barroso goes on to say that Spain is out of the woods and that Portugal is enjoying its ninth month of falling unemployment. In reality the numbers employed in Portugal have merely stabilised after crashing from 5.228m to 4.554m. The young are still migrating, flattering the jobless rate.

 

Portugal may well succeed in tapping the debt markets in the current mood of near euphoria, but what does that tell us? Portugal's public debt has jumped from 108pc to 128pc of GDP in the last two years (IMF), a pattern replicated in Italy and Spain.

This has happened in part because contractionary policies have themselves played havoc with debt dynamics. A rising debt burden has to be supported on a shrinking nominal GDP base. The EMU slide towards deflation is tightening the screw further through the denominator effect.

 

Portugal's budget deficit is coming down at a glacial pace and is still 5.5pc of GDP (with no QE offset to erode the debt effects). Portugal's net international investment position (NIIP) – what really matters – has risen from minus 105pc to minus 114pc of GDP since 2011. Spain's is not much better at minus 92pc. (...).

O mundo mudou. Os ciclos políticos aceleram e, com a proximidade de eleições europeias e legislativas em Portugal e depois Espanha, convém mascarar o que tem sido o gigantesco fracasso da resposta à crise com êxitos menores suportados por dados falseados e/ou nada conclusivos. Isto enquanto a economia norte-americana (que optou por políticas expansionistas depois de 2008) continua a crescer a um ritmo cada vez mais acelerado e a criar empregos como não se via desde a era Clinton. Seis anos depois, apenas a Alemanha prospera na Europa. Mas tudo corre bem, é o "milagre económico".

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