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Arrastão: Os suspeitos do costume.

"Por causa é a subir"*

Pedro Sales, 25.11.08


Em resposta a este post, o João Pinto e Castro mostra que não acredita que seja possível uma rede partilhada de bicicletas em determinadas zonas de Lisboa. Não senhor, que isto é tudo a subir. Para corroborar deixa mesmo alguns exemplos. Entre eles, os "impensáveis" 600 metros que ligam a Praça de Londres ao cruzamento da Av. Roma com a dos EUA. Como a maioria dos leitores do Arrastão não tem a obrigação de conhecer a inclinação das ruas de Lisboa, deixo aqui um pequeno filme com o meu filho, quando tinha 2 anos e meio, a subir a mítica pendente da Avenida de Roma, ilustre representação de um Koppenberg à beira mar plantado. Que os hercúleos músculos de uma criança de 12 quilos, a arrastar 11 quilos com duas rodas, sejam capazes de locomover uma bicicleta não prova que o João Pinto e Castro seja contra a utilização pública de bicicletas em qualquer zona do planeta. Não senhor. Desde que se proceda previamente à terraplanagem de todos os declives superiores a cinco centímetros, o João Pinto e Castro aí estará para o defender.

* como diria o meu filho.

Sol

Pedro Sales, 22.11.08

A branco, as zonas com um declive entre 0%-4%. Imagem retirada do Ecoblogue.


Estas postas do maradona têm suscitado o notório agradado de meia blogosfera. Compreende-se. A ideia de que é impossível usar a bicicleta como meio de transporte na capital deve ser mais antiga que a própria cidade. Parece que as características topográficas e meteorológicas de Lisboa tornam impensável uma rede de bicicletas partilhada como meio de locomoção, uma solução crescentemente utilizada um pouco por toda a Europa.
O maradona exemplifica: “sem ser eu, duvido que haja alguém na blogoesfera que consiga subir de bicicleta dos Restauradores ao Príncipe Real sem parar para respirar”. É certo que, por muitas voltas que se dê, deve ser difícil ligar esses dois pontos da cidade sem ter que transpor algumas ruas com 6 ou 7% de inclinação longitudinal (um valor muito pouco recomendável para quem não tenha as “pernas espectaculares” do maradona). O mesmo acontece em quase todo a zona histórica da cidade, da Graça à Mouraria, do Cais do Sodré ao Chiado. Mas também não é menos certo que 65% de Lisboa - e onde mora, trabalha e estuda a quase totalidade dos seus habitantes - apresenta um declive longitudinal a inferior 5% (como se pode ver no mapa). Não é preciso ser nenhum atleta para se conseguir deslocar de bicicleta, sem nenhum esforço por aí além, de Telheiras ou Alvalade até ao Rossio, ou de Benfica até às Avenidas Novas.

De acordo com os padrões internacionais para a definição de redes cicláveis nas cidades, declives até aos 5% são aceitáveis. Foi esse, de resto, o critério seguido pela equipa do Instituto Superior de Agronomia quando elaborou um plano para uma rede ciclável em Lisboa, deixando o centro histórico, com as tais ruas íngremes e estreitas de que fala o maradona, de parte. Quer isso dizer que Lisboa é ciclável para o cidadão comum? Depende do percurso. Não sendo de esperar a criação de postos de troca de bicicletas no Bairro Alto ou na Bica, é claramente possível utilizar a bicicleta numa parte muito significativa da cidade, não havendo nenhuma razão para que estas tenham que ser acantonadas à condição de instrumento de lazer.

O outro argumento já tinha sido utilizado pelo PSD na Assembleia Municipal. Havendo poucas pessoas a andar diariamente de bicicleta em Lisboa, não se deve "hipotecar a já pouca largura da maior parte das nossas ruas a um capricho ecológico ridículo". Em rigor, as ruas e os passeios de Lisboa já estão hipotecados: ao estacionamento caótico de carros em filas sucessivas, transformando artérias de quatro vias em ruas de sentido único. Não são as hipotéticas ciclovias a criar, mas os 600 mil carros que circulam diariamente em Lisboa, que “torna esta cidade tão mal preparada para fazer circular com a prioridade e conforto necessários a merda de um autocarro”.

Numa cidade onde, quando vou de bicicleta, consigo fazer em 20 minutos o percurso de seis quilómetros que liga a minha casa ao meu local de trabalho, mas onde nunca me despacho em menos de 30 quando vou de táxi, gostava de perceber onde é que o maradona foi buscar a ideia de que a promoção das bicicletas indica que “não há qualquer sinal de que se pense nas pessoas, na vida que as pessoas levam e na relação delas com a cidade, apenas um vago desejo de progresso”.
O que o maradona entende como um modelo escandinavo, que torna normal andar de bicicleta em Amesterdão ou Estocolmo, tem muito menos a ver com as condicionantes morfológicas das cidades do que com os condicionalismos económicos e políticos da II Guerra Mundial. A redescoberta da bicicleta na Europa, e que começa a ter lugar no outro lado do Atlântico em cidades tão planas como São Francisco, é agora impulsionada pelas preocupações ecológicas e de controlo do tráfego. A julgar pelo sucesso que está a conseguir em cidades como Barcelona ou Paris – que também tem Montmartre - parece que as pessoas de que fala o maradona não se têm importunado muito.

Sol

Pedro Sales, 22.11.08

A branco, as zonas com um declive entre 0%-4%. Imagem retirada do Ecoblogue.


Estas postas do maradona têm suscitado o notório agradado de meia blogosfera. Compreende-se. A ideia de que é impossível usar a bicicleta como meio de transporte na capital deve ser mais antiga que a própria cidade. Parece que as características topográficas e meteorológicas de Lisboa tornam impensável uma rede de bicicletas partilhada como meio de locomoção, uma solução crescentemente utilizada um pouco por toda a Europa.
O maradona exemplifica: “sem ser eu, duvido que haja alguém na blogoesfera que consiga subir de bicicleta dos Restauradores ao Príncipe Real sem parar para respirar”. É certo que, por muitas voltas que se dê, deve ser difícil ligar esses dois pontos da cidade sem ter que transpor algumas ruas com 6 ou 7% de inclinação longitudinal (um valor muito pouco recomendável para quem não tenha as “pernas espectaculares” do maradona). O mesmo acontece em quase todo a zona histórica da cidade, da Graça à Mouraria, do Cais do Sodré ao Chiado. Mas também não é menos certo que 65% de Lisboa - e onde mora, trabalha e estuda a quase totalidade dos seus habitantes - apresenta um declive longitudinal a inferior 5% (como se pode ver no mapa). Não é preciso ser nenhum atleta para se conseguir deslocar de bicicleta, sem nenhum esforço por aí além, de Telheiras ou Alvalade até ao Rossio, ou de Benfica até às Avenidas Novas.

De acordo com os padrões internacionais para a definição de redes cicláveis nas cidades, declives até aos 5% são aceitáveis. Foi esse, de resto, o critério seguido pela equipa do Instituto Superior de Agronomia quando elaborou um plano para uma rede ciclável em Lisboa, deixando o centro histórico, com as tais ruas íngremes e estreitas de que fala o maradona, de parte. Quer isso dizer que Lisboa é ciclável para o cidadão comum? Depende do percurso. Não sendo de esperar a criação de postos de troca de bicicletas no Bairro Alto ou na Bica, é claramente possível utilizar a bicicleta numa parte muito significativa da cidade, não havendo nenhuma razão para que estas tenham que ser acantonadas à condição de instrumento de lazer.

O outro argumento já tinha sido utilizado pelo PSD na Assembleia Municipal. Havendo poucas pessoas a andar diariamente de bicicleta em Lisboa, não se deve "hipotecar a já pouca largura da maior parte das nossas ruas a um capricho ecológico ridículo". Em rigor, as ruas e os passeios de Lisboa já estão hipotecados: ao estacionamento caótico de carros em filas sucessivas, transformando artérias de quatro vias em ruas de sentido único. Não são as hipotéticas ciclovias a criar, mas os 600 mil carros que circulam diariamente em Lisboa, que “torna esta cidade tão mal preparada para fazer circular com a prioridade e conforto necessários a merda de um autocarro”.

Numa cidade onde, quando vou de bicicleta, consigo fazer em 20 minutos o percurso de seis quilómetros que liga a minha casa ao meu local de trabalho, mas onde nunca me despacho em menos de 30 quando vou de táxi, gostava de perceber onde é que o maradona foi buscar a ideia de que a promoção das bicicletas indica que “não há qualquer sinal de que se pense nas pessoas, na vida que as pessoas levam e na relação delas com a cidade, apenas um vago desejo de progresso”.
O que o maradona entende como um modelo escandinavo, que torna normal andar de bicicleta em Amesterdão ou Estocolmo, tem muito menos a ver com as condicionantes morfológicas das cidades do que com os condicionalismos económicos e políticos da II Guerra Mundial. A redescoberta da bicicleta na Europa, e que começa a ter lugar no outro lado do Atlântico em cidades tão planas como São Francisco, é agora impulsionada pelas preocupações ecológicas e de controlo do tráfego. A julgar pelo sucesso que está a conseguir em cidades como Barcelona ou Paris – que também tem Montmartre - parece que as pessoas de que fala o maradona não se têm importunado muito.

Sol

Pedro Sales, 22.11.08

A branco, as zonas com um declive entre 0%-4%. Imagem retirada do Ecoblogue.


Estas postas do maradona têm suscitado o notório agradado de meia blogosfera. Compreende-se. A ideia de que é impossível usar a bicicleta como meio de transporte na capital deve ser mais antiga que a própria cidade. Parece que as características topográficas e meteorológicas de Lisboa tornam impensável uma rede de bicicletas partilhada como meio de locomoção, uma solução crescentemente utilizada um pouco por toda a Europa.
O maradona exemplifica: “sem ser eu, duvido que haja alguém na blogoesfera que consiga subir de bicicleta dos Restauradores ao Príncipe Real sem parar para respirar”. É certo que, por muitas voltas que se dê, deve ser difícil ligar esses dois pontos da cidade sem ter que transpor algumas ruas com 6 ou 7% de inclinação longitudinal (um valor muito pouco recomendável para quem não tenha as “pernas espectaculares” do maradona). O mesmo acontece em quase todo a zona histórica da cidade, da Graça à Mouraria, do Cais do Sodré ao Chiado. Mas também não é menos certo que 65% de Lisboa - e onde mora, trabalha e estuda a quase totalidade dos seus habitantes - apresenta um declive longitudinal a inferior 5% (como se pode ver no mapa). Não é preciso ser nenhum atleta para se conseguir deslocar de bicicleta, sem nenhum esforço por aí além, de Telheiras ou Alvalade até ao Rossio, ou de Benfica até às Avenidas Novas.

De acordo com os padrões internacionais para a definição de redes cicláveis nas cidades, declives até aos 5% são aceitáveis. Foi esse, de resto, o critério seguido pela equipa do Instituto Superior de Agronomia quando elaborou um plano para uma rede ciclável em Lisboa, deixando o centro histórico, com as tais ruas íngremes e estreitas de que fala o maradona, de parte. Quer isso dizer que Lisboa é ciclável para o cidadão comum? Depende do percurso. Não sendo de esperar a criação de postos de troca de bicicletas no Bairro Alto ou na Bica, é claramente possível utilizar a bicicleta numa parte muito significativa da cidade, não havendo nenhuma razão para que estas tenham que ser acantonadas à condição de instrumento de lazer.

O outro argumento já tinha sido utilizado pelo PSD na Assembleia Municipal. Havendo poucas pessoas a andar diariamente de bicicleta em Lisboa, não se deve "hipotecar a já pouca largura da maior parte das nossas ruas a um capricho ecológico ridículo". Em rigor, as ruas e os passeios de Lisboa já estão hipotecados: ao estacionamento caótico de carros em filas sucessivas, transformando artérias de quatro vias em ruas de sentido único. Não são as hipotéticas ciclovias a criar, mas os 600 mil carros que circulam diariamente em Lisboa, que “torna esta cidade tão mal preparada para fazer circular com a prioridade e conforto necessários a merda de um autocarro”.

Numa cidade onde, quando vou de bicicleta, consigo fazer em 20 minutos o percurso de seis quilómetros que liga a minha casa ao meu local de trabalho, mas onde nunca me despacho em menos de 30 quando vou de táxi, gostava de perceber onde é que o maradona foi buscar a ideia de que a promoção das bicicletas indica que “não há qualquer sinal de que se pense nas pessoas, na vida que as pessoas levam e na relação delas com a cidade, apenas um vago desejo de progresso”.
O que o maradona entende como um modelo escandinavo, que torna normal andar de bicicleta em Amesterdão ou Estocolmo, tem muito menos a ver com as condicionantes morfológicas das cidades do que com os condicionalismos económicos e políticos da II Guerra Mundial. A redescoberta da bicicleta na Europa, e que começa a ter lugar no outro lado do Atlântico em cidades tão planas como São Francisco, é agora impulsionada pelas preocupações ecológicas e de controlo do tráfego. A julgar pelo sucesso que está a conseguir em cidades como Barcelona ou Paris – que também tem Montmartre - parece que as pessoas de que fala o maradona não se têm importunado muito.

Arranja-me uma casinha II

Pedro Sales, 29.09.08


O envelhecimento e progressiva desertificação do centro de Lisboa nos últimas décadas é o que torna mais difícil de “engolir” o escândalo do património disperso da Câmara de Lisboa. Lisboa perdeu 250 mil habitantes desde 1981. São milhares e milhares de jovens que, perante o preço do mercado imobiliário, se refugiaram nos subúrbios. Esse fluxo migratório tem consequências na vida da cidade. A cidade torna-se mais insegura, o trânsito insuportável, o planeamento urbano caótico, o comércio e transporte nocturno uma miragem. Há anos e anos que não há candidatura autárquica que se preze que não prometa “repovoar” Lisboa com jovens.

Ora, pelo que agora se sabe, para além dos fogos da habitação social, a câmara dispõe de 3200 casas espalhadas pela capital. E durante as três décadas em que a cidade se foi envelhecendo e desertificando, os sucessivos executivos preferiram distribuir apartamentos a amigos, directores municipais, da polícia, jornalistas, vereadores e sabe-se lá a quem mais. Algumas das casas terão sido certamente entregues a quem precisava, não duvido. Mas a questão de fundo mantém-se. Sem critérios claros, a distribuição destas casas foi casuística e nepotista. Pior. A câmara hipotecou o principal instrumento de que dispunha para influenciar os preços do mercado e para chamar jovens em início de carreira, efectivamente necessitados de rendas controladas, para o centro da cidade. Escolheu a via mais fácil. A inexistência de regras, permitiu a quem pôde entregar casas a todos quantos se sabiam movimentar nos corredores do Paços do Concelho.

É por isso que as declarações hoje proferidas por Ana Sara Brito são uma afronta aos milhares de jovens que, querendo continuar em Lisboa, passam horas e horas nos transportes para conseguir trabalhar na capital. Diz a vereadora da habitação que, tendo uma casa cedida por Krus Abecassis, o contrato sempre foi legal e a renda foi sendo actualizada ao longo destes 20 anos. Não duvido. Mas, verdade verdadinha, é que quando deixou a casa, em 2007, pagava cento e cinquenta euros por mês. Se o contrato não é de favor, o preço não engana. Ana Sara Brito, com um salário certamente superior a 90% dos lisboetas, vivia numa casa ao lado da principal artéria da capital, pagando um renda que não dá para alugar um simples quarto na periferia.  Ana Sara Brito está a mais no cargo que ocupa. Se não o percebe, o mais certo é que os lisboetas acabem por o fazer por si.

PS: António Costa solicitou solicitou um parecer à Comissão Nacional de Dados para divulgar a lista do património disperso da autarquia, quem o ocupa e as rendas praticadas. Fez bem. Perante o avolumar da história não há nada como divulgar todos os nomes. Até porque, como se tem visto, tudo o que sai na imprensa vem da mesma fonte. Está na altura de conhecer toda a história, e não apenas a que mais convém a Santana Lopes e Helena Lopes da Costa.

Arranja-me uma casinha II

Pedro Sales, 29.09.08


O envelhecimento e progressiva desertificação do centro de Lisboa nos últimas décadas é o que torna mais difícil de “engolir” o escândalo do património disperso da Câmara de Lisboa. Lisboa perdeu 250 mil habitantes desde 1981. São milhares e milhares de jovens que, perante o preço do mercado imobiliário, se refugiaram nos subúrbios. Esse fluxo migratório tem consequências na vida da cidade. A cidade torna-se mais insegura, o trânsito insuportável, o planeamento urbano caótico, o comércio e transporte nocturno uma miragem. Há anos e anos que não há candidatura autárquica que se preze que não prometa “repovoar” Lisboa com jovens.

Ora, pelo que agora se sabe, para além dos fogos da habitação social, a câmara dispõe de 3200 casas espalhadas pela capital. E durante as três décadas em que a cidade se foi envelhecendo e desertificando, os sucessivos executivos preferiram distribuir apartamentos a amigos, directores municipais, da polícia, jornalistas, vereadores e sabe-se lá a quem mais. Algumas das casas terão sido certamente entregues a quem precisava, não duvido. Mas a questão de fundo mantém-se. Sem critérios claros, a distribuição destas casas foi casuística e nepotista. Pior. A câmara hipotecou o principal instrumento de que dispunha para influenciar os preços do mercado e para chamar jovens em início de carreira, efectivamente necessitados de rendas controladas, para o centro da cidade. Escolheu a via mais fácil. A inexistência de regras, permitiu a quem pôde entregar casas a todos quantos se sabiam movimentar nos corredores do Paços do Concelho.

É por isso que as declarações hoje proferidas por Ana Sara Brito são uma afronta aos milhares de jovens que, querendo continuar em Lisboa, passam horas e horas nos transportes para conseguir trabalhar na capital. Diz a vereadora da habitação que, tendo uma casa cedida por Krus Abecassis, o contrato sempre foi legal e a renda foi sendo actualizada ao longo destes 20 anos. Não duvido. Mas, verdade verdadinha, é que quando deixou a casa, em 2007, pagava cento e cinquenta euros por mês. Se o contrato não é de favor, o preço não engana. Ana Sara Brito, com um salário certamente superior a 90% dos lisboetas, vivia numa casa ao lado da principal artéria da capital, pagando um renda que não dá para alugar um simples quarto na periferia.  Ana Sara Brito está a mais no cargo que ocupa. Se não o percebe, o mais certo é que os lisboetas acabem por o fazer por si.

PS: António Costa solicitou solicitou um parecer à Comissão Nacional de Dados para divulgar a lista do património disperso da autarquia, quem o ocupa e as rendas praticadas. Fez bem. Perante o avolumar da história não há nada como divulgar todos os nomes. Até porque, como se tem visto, tudo o que sai na imprensa vem da mesma fonte. Está na altura de conhecer toda a história, e não apenas a que mais convém a Santana Lopes e Helena Lopes da Costa.

Arranja-me uma casinha II

Pedro Sales, 29.09.08


O envelhecimento e progressiva desertificação do centro de Lisboa nos últimas décadas é o que torna mais difícil de “engolir” o escândalo do património disperso da Câmara de Lisboa. Lisboa perdeu 250 mil habitantes desde 1981. São milhares e milhares de jovens que, perante o preço do mercado imobiliário, se refugiaram nos subúrbios. Esse fluxo migratório tem consequências na vida da cidade. A cidade torna-se mais insegura, o trânsito insuportável, o planeamento urbano caótico, o comércio e transporte nocturno uma miragem. Há anos e anos que não há candidatura autárquica que se preze que não prometa “repovoar” Lisboa com jovens.

Ora, pelo que agora se sabe, para além dos fogos da habitação social, a câmara dispõe de 3200 casas espalhadas pela capital. E durante as três décadas em que a cidade se foi envelhecendo e desertificando, os sucessivos executivos preferiram distribuir apartamentos a amigos, directores municipais, da polícia, jornalistas, vereadores e sabe-se lá a quem mais. Algumas das casas terão sido certamente entregues a quem precisava, não duvido. Mas a questão de fundo mantém-se. Sem critérios claros, a distribuição destas casas foi casuística e nepotista. Pior. A câmara hipotecou o principal instrumento de que dispunha para influenciar os preços do mercado e para chamar jovens em início de carreira, efectivamente necessitados de rendas controladas, para o centro da cidade. Escolheu a via mais fácil. A inexistência de regras, permitiu a quem pôde entregar casas a todos quantos se sabiam movimentar nos corredores do Paços do Concelho.

É por isso que as declarações hoje proferidas por Ana Sara Brito são uma afronta aos milhares de jovens que, querendo continuar em Lisboa, passam horas e horas nos transportes para conseguir trabalhar na capital. Diz a vereadora da habitação que, tendo uma casa cedida por Krus Abecassis, o contrato sempre foi legal e a renda foi sendo actualizada ao longo destes 20 anos. Não duvido. Mas, verdade verdadinha, é que quando deixou a casa, em 2007, pagava cento e cinquenta euros por mês. Se o contrato não é de favor, o preço não engana. Ana Sara Brito, com um salário certamente superior a 90% dos lisboetas, vivia numa casa ao lado da principal artéria da capital, pagando um renda que não dá para alugar um simples quarto na periferia.  Ana Sara Brito está a mais no cargo que ocupa. Se não o percebe, o mais certo é que os lisboetas acabem por o fazer por si.

PS: António Costa solicitou solicitou um parecer à Comissão Nacional de Dados para divulgar a lista do património disperso da autarquia, quem o ocupa e as rendas praticadas. Fez bem. Perante o avolumar da história não há nada como divulgar todos os nomes. Até porque, como se tem visto, tudo o que sai na imprensa vem da mesma fonte. Está na altura de conhecer toda a história, e não apenas a que mais convém a Santana Lopes e Helena Lopes da Costa.

Contas antigas e contas eleitorais

Daniel Oliveira, 18.06.08

O PSD apresentou a mais absurda moção de censura inventada até hoje: contra um só vereador por causa de uma coisa que foi decidida por outro vereador que foi poupado à censura. E o PCP absteve-se, dando sinais que as suas prioridades são eleitorais.

Os deputados municipais do Bloco vieram em defesa de Sá Fernandes e a concelhia de Lisboa do BE também. Fico muito satisfeito por tal ter sucedido. Como morador do bairro onde tudo está a acontecer e apoiando activamente a luta contra o que se está a fazer na Praça das Flores (quanto mais não seja, para que da próxima se faça diferente), não deixo de saber distinguir a defesa dos direitos dos munícipes de uma mesquinha vingança política.

Esta moção não tem sentido. Nem o que sucedeu justifica uma moção de censura, nem se percebe porque é que a moção se dirige a este vereador em particular. Ou melhor: percebe-se. Mas não tem nada a ver com a Praça das Flores. São contas antigas. As de um tempo em que o PSD tinha, esse sim, uma ideia muito própria do que era o interesse público quando fazia negócios com os terrenos da feira popular e do Parque Mayer. Aí sim, privatizava-se o que era público. E de forma bem pouco clara.

Marcos Perestrelo, vice-presidente da Câmara e responsável pelos espaços públicos, continua protegido no seu gabinete. Parece poder continuar a contar com a ajuda do PSD e do PCP. Mais altos valores se levantam.

Não é assim

Daniel Oliveira, 07.06.08
No mesmo momento em que o Bloco de Esquerda participa com Manuel Alegre, dirigente, deputado e militante do PS, num comício e acha isso normal (eu acho), seria estranho que criticasse um vereador independente, que não é nem dirigente nem militante do Bloco, por reunir com quem entende. Se acha que tal lhe deveria ser comunicado, diz isso ao vereador, não aos jornais.

Acho que o Bloco deve fazer uma avaliação do trabalho de Sá Fernandes. A reestruturação das empresas municipais e o caso da Praça das Flores são alguns casos que devem ser debatidos. Segundo sei, estão a ser debatidos entre o Bloco e o vereador independente e parece que há, num caso problemas de concretização e no outro divergências. É saudável. E que elas sejam públicas também. Sá Fernandes é independente do Bloco, o Bloco, enquanto partido, é livre de ser crítico em relação a medidas tomadas por Sá Fernandes. Aqui o fiz. Mais: o Bloco pode e deve avaliar o cumprimento do acordo celebrado entre o BE e Sá Fernandes e entre Sá Fernandes e António Costa. Se o balanço for negativo pode e deve tirar daí conclusões e com lealdade e clareza tomar decisões políticas.

Mas transformar este debate num jogo de suspeitas públicas sobre a lealdade do vereador não é como se espera que o Bloco resolva divergências. Interessa o conteúdo das políticas na capital. O resto não tem qualquer relevância pública. Nem para os lisboetas nem para os eleitores do Bloco.

Sá Fernandes terá defeitos, alguns resultantes de inexperiência na vida politico-partidária. Mas falta de lealdade pessoal e política não é seguramente um deles. Aqui está uma coisa que devemos aprender com a forma como, por exemplo, o PCP faz os cortes políticos internos ou com aliados: não transforma-los em avaliações de carácter ou de lealdade. Deixa feridas e ressentimentos que nunca saram.