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Arrastão: Os suspeitos do costume.

É a economia, estúpido!

Sérgio Lavos, 29.05.12

 

O João Miranda, na ânsia de convencer os amigos liberais d'O Insurgente de que é a mesma coisa reduzir o défice pela via do aumento de impostos ou pela via do corte das despesas, e que falar da Curva de Laffer no reajusmento em curso não faz sentido, faz um breve apanhado do que era Portugal quando chegou a troika. O outrora liberal João Miranda ganhou um súbito apego à política deste Governo, que no fundo decidiu empobrecer o país sem tocar nos interesses instalados ao longo de décadas. Como decidiu fazê-lo? Aumentando impostos sobre o consumo - quando se calhar faria mais sentido aumentar os impostos sobre o rendimento - e cortando nas despesas sociais. A primeira medida levou a uma queda acentuada no consumo, o que por sua vez levou à diminuição da receita fiscal - e lá se foi o objectivo do aumento da receita do estado. A segunda medida, que poderia ter como efeito uma efectiva redução da despesa pública, foi contrariada pela pressão sobre a economia e o consumo interno; a recessão levou ao aumento acelerado do desemprego, o que, como seria expectável, levou não só a uma redução das contribuições sociais (ao que parece, os desempregados não contribuem para a Segurança Social) mas também, claro, a um aumento do pagamento das prestações sociais - subsídio de desemprego, RSI, reformas antecipadas. Tudo somado, as despesas sociais estão a aumentar, levando a um acentuado crescimento da despesa no subsector Estado.

 

Um ano depois, o que temos:

 

- Estado sem crédito, pagando muito mais pela colocação de dívida, e uma banca a precisar de ser recapitalizada - é para isso que serve grande parte do dinheiro emprestado pela troika.

 

- Orçamento com um défice imprevisível, mas certamente acima do previsto, 4.5%, e conseguido muito à custa de receitas extraordinárias - corte nos subsídios de Férias e de Natal e privatizações de áreas fulcrais da economia.

 

- Economia com um sector de dimensão significativa dependente de obras públicas e do défice - portanto, exactamente igual ao que era antes, ou será que as PPP's já foram erradicadas?

 

- Economia alavancada e dependente do crédito - o regresso aos mercados em 2013 é o grande desígnio deste Governo.

 

- Economia ainda dependente da despesa pública - a história dos salários da Função Pública acima da média é uma chalaça do João Miranda, para quem qualquer coisa acima do nível de salários da China já é um gasto excessivo. Ainda bem que ele não é funcionário público...

 

- E, acrescento eu, um desemprego real de mais de 20% (1 milhão e 200 000 pessoas); quase 2 milhões de pessoas pobres ou no limiar da pobreza; dezenas de empresas a fechar todos os dias; crescimento exponencial das desigualdades sociais (acesso aos cuidados de saúde, educação, etc.); crescimento da dívida pública - já ultrapassa os 120%.

 

Resumindo, esta é sem dúvida a melhor receita e estamos a caminho de nos tornarmos um exemplo para o mundo. A recessão e o empobrecimento são, claramente, inevitáveis, como diz o João Miranda. E não vejo como isso não possa ser uma coisa boa...

O enorme poder da estupidez humana

Daniel Oliveira, 29.05.12

 

A senhora Lagarde, que recebe 380 mil euros por ano e não tem de pagar impostos, mandou os gregos pagarem os seus. A senhora Lagarde, que é uma das mulheres que melhor veste no mundo, com a preciosa contribuição de dinheiros públicos, diz que não se preocupa muito com as crianças gregas. Preocupam-na mais as da Niger, que o coração da burocrata não tem espaço para demasiada gente. A senhora Lagarde, na sua profunda cretinice, fez um favor ao Syriza ao insultar os gregos. É bom haver pessoas como ela. Como não vão a votos, tendem para a incontinência verbal e dizem às claras o que alguns eleitos até em conversas privadas evitam confessar: que se estão nas tintas para os que estão a sofrer com esta crise.

 

O senhor Cavaco gosta de agradar a gente como a senhora Lagarde. Em Sidney, explicou que o único problema que existe neste momento na União Europeia chama-se Grécia. Anda o mundo a discutir a fragilidade do euro e a inépcia das instituições europeias, que podem levar todo o planeta para uma crise económica de larga escala, e o senhor Cavaco pensa que tudo começa e acaba em Atenas. Como Portugal gosta de imitar os crescidos, o Presidente lá deu a sua achega para a pressão geral sobre os gregos: "Portugal deseja que a Grécia permaneça na zona do euro, mas essa decisão depende do povo grego e essa decisão será com certeza manifestada nas eleições gregas que vão ter lugar a 17 de junho". É tão giro ver o pequenito a fingir que é fanfarrão.

 

A forma como a Europa está a tratar o povo grego poderá ter (e espero que tenha) uma resposta no dia 17. É possível que os gregos achem que a senhora Lagarde deve enfiar as suas preocupações e conselhos na sua mala Louis Vuitton e que desconheçam quem seja o senhor Cavaco. É até plausível que os gregos sejam diferentes dos portugueses e não sintam grande simpatia por quem fala com eles com paternalismo e arrogância.

 

Anda por aí muito esperto que, não tendo grande respeito pela democracia, sonha com uma punição dos gregos depois de dia 17. Para que os restantes povos percebam que, nos dias de hoje, a democracia não passa de uma encenação. Descobrirão com espanto que a Grécia está longe de ser o único ou até o principal problema da Europa. Mas que o euro, para o mal ou para bem, está amarrado ao destino do primeiro país que for atirado borda fora. O que os povos perceberão nesse dia é outra coisa: que a União Europeia é um projeto falhado e que dele se queiram ver livres o mais depressa possível. Regressados então à velha Europa dos nacionalismos agressivos, poderemos agradecer à mais medíocre geração de políticos que a Europa conheceu desde do fim da Segunda Guerra. O nosso maior erro é sempre este: subestimar o enorme poder da estupidez humana.

 

Publicado no Expresso Online

A lei tem de saber como lidar com gangsters.

Daniel Oliveira, 28.05.12

 

Tudo o que sabíamos dos serviços secretos do Estado português, Jorge Silva Carvalho e a Ongoing chegava e sobrava para uma ação exemplar, em que não ficasse pedra sobre pedra. A informação de que Silva Carvalho e outros ex-agentes do SIED, a trabalhar para Ongoing, recolheram e fazeram divulgar informações sobre a vida privada de Francisco Pinto Balsemão, dono da Imprensa, com quem a empresa empregadora do ex-espião mantém um contencioso (que, para que fique claro, não me diz respeito), já está para lá do que se poderia imaginar.

 

Se tudo o que temos sabido for verdade, ninguém está a salvo. Qualquer um que critique Silva Carvalho ou ponha em causa os interesses da Ongoing pode ver, de um dia para o outro, a sua vida privada devassada. Como em qualquer ditadura, o poder desta gente sustentar-se-á no medo.

 

Tudo isto começa a atingir proporções tão assustadoras que não pudemos fechar os olhos. Se a Ongoing e Silva Carvalho fizeram o que se escreve que fizeram, todos os responsáveis por isto têm de acabar atrás das grades. E todos os seus cúmplices políticos têm de ser responsabilizados. Porque com a nossa liberdade não se brinca.

 

Por enquanto, estamos perante uma nebulosa. É tudo demasiado escabroso e reles para parecer verdade. Mas isto não é mais um escândalo. Que se cuidem os que, tendo um envolvimento direto ou indireto nisto, estão só à espera que a coisa passe. Se ainda nos consideramos um Estado de Direito, não pode passar. Confirmando tudo o que se tem escrito, estamos perante gangsters. E a lei tem de saber como lidar com gangsters e com os seus cúmplices.

 

Publicado no Expresso Online

Sabedoria popular - um post com dedicatória

Sérgio Lavos, 28.05.12

"À espera dos comentários do professor Marcelo, lá papo uma reportagem da TVI sobre a educação d'antanho. Vinte ou trinta carquejas com o diploma da quarta classe recitam títulos das obras de el rey Duarte e feitos da dona Barbuda de Guimarães. O subtexto da coisa é cristalino: os meninos antigamente sabiam mais que os doutores agora, e tal.

 

Esta entronização da parolice é a moda da saison desde que o ministro Crato decidiu apresentar às criancinhas as virtudes da lavoura. Pouco importa que os jovens de 2012 saibam programar em PHP e JavaScript, que conheçam países sem entrarem neles a salto e dominem razoavelmente o inglês: para milhões de pategos lusitanos, muitos deles atarantados com os comandos da TV, a única educação que presta é a de Oliveira Salazar.

 

E isto seria apenas grave, se alguns não estivessem no Governo."

 

Luís M. Jorge.

Nojo

Sérgio Lavos, 26.05.12

Para quem possa ter dúvidas sobre o grau de solidariedade do capitalismo predatório, personificado pela espécie de coisa Christine Lagarde, líder do FMI:

“Penso mais nas crianças de uma escola numa pequena aldeia no Níger que têm duas horas de aulas por dia e têm de dividir uma cadeira por três”, comparou Lagarde quando questionada sobre como conseguia não pensar nas mães que não têm acesso a parteiras ou em pacientes que não conseguem obter medicamentos de que precisam para sobreviver. “Tenho-as sempre na minha mente, porque acho que precisam mais de ajuda do que as pessoas em Atenas.”

 

Na Grécia, o povo é quem mais ordena

Daniel Oliveira, 25.05.12

 

Carta aberta aos Presidentes do Parlamento Europeu, da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu e do Fundo Monetário Internacional

 

Nas eleições de 6 de Maio o povo grego exprimiu democraticamente a sua vontade, manifestando a sua oposição às condições impostas pelo programa de assistência financeira. Essas condições lançaram os gregos no desespero e na miséria. Pela sua brutalidade, as medidas do programa estão a dilacerar a sociedade grega, provocando rupturas incompatíveis com uma recuperação social e económica que salvaguardem padrões de vida aceitáveis para a dignidade de todo o povo. 

 

Goradas as negociações para a constituição de um governo, os gregos vão regressar às urnas no próximo dia 17 de Junho. Trata-se de uma decisão enquadrada nas regras democráticas daquele país. Porém, está a assistir-se da parte dos mais altos representantes das instâncias internacionais a declarações que em nada facilitam uma solução ajustada à situação que se vive naquele país. Pelo contrário, as tomadas de posição já conhecidas vão no sentido de influenciar e condicionar a liberdade de escolha e decisão dos gregos, ao colocar na agenda política, ao arrepio dos tratados europeus, a sua saída da zona euro com todas as consequências daí decorrentes.

 

Por outro lado, no mesmo sentido da consulta eleitoral na Grécia, os resultados das consultas eleitorais realizadas recentemente em França, na Alemanha, em Itália e no Reino Unido deram um sinal inequívoco de que também naqueles países as populações estão a rejeitar as medidas de austeridade que lhes querem impor em nome de um ajustamento orçamental cujos exemplos já conhecidos em nada estão a contribuir para melhorar as economias, nem sequer se revelam úteis para atingir o apregoado objectivo de resolver o problema das suas dívidas públicas.

 

Por estas razões, os signatários desta carta aberta entendem que nas actuais circunstâncias se deve expressar todo o apoio e solidariedade ao povo grego, exigindo o cancelamento das medidas de austeridade que lhe foram impostas. Entendem também que os governos europeus não devem poupar esforços junto da Comissão Europeia e do Banco Central Europeu para serem encontradas soluções que aliviem a tensão vivida em toda a Europa. Exigem, finalmente, que sejam respeitados os resultados das eleições de 17 de Junho enquanto escolha democrática do povo grego.

 

LEIA EM BAIXO OS SUBSCRITORES E ASSINE AQUI

 

Petição Sem Ciência Não Há Futuro

Miguel Cardina, 25.05.12

A ciência em Portugal encontra-se - para utilizarmos uma linguagem algo eufemística - numa encruzilhada. A situação agrava-se a cada dia que passa e configura um projecto claro de desinvestimento e precarização que não é de agora mas que se tem vindo a agravar substancialmente. Por isso assinei a carta aberta que segue abaixo:

 

CARTA ABERTA AO MINISTRO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA,
PROFESSOR DOUTOR NUNO CRATO

Exmo. Senhor Ministro da Educação e Ciência,
Portugal atravessa a maior crise económica e social desde a conquista da democracia. Esta crise traduz-se em níveis preocupantes de desemprego e da precariedade laboral, no aumento do preço de todos os bens e serviços essenciais às famílias e numa redução brutal, e sem precedentes, dos apoios sociais aos mais desfavorecidos.
Consideramos que a aposta na Ciência configura uma das soluções mais eficazes para a saída da crise, promovendo o desenvolvimento do país e a qualificação cultural, científica e social dos seus cidadãos, o que, a par do desenvolvimento da tecnologia, permitirá relançar a economia nacional e criar emprego.

Para que esta solução se concretize impõem-se algumas medidas imediatas.
O aumento da “fuga de cérebros”, fruto da ausência de oportunidades e da degradação das condições para realizar investigação em Portugal, representa um impensável desperdício económico em época de crise: é o investimento de décadas na Educação que agora abandona o país.

Sabemos que concorda connosco.

É aos bolseiros de investigação científica que se deve o recente impulso no conhecimento científico e tecnológico português. O incremento da produção científica e tecnológica nacional, em quantidade e em qualidade, que tem sido reconhecido e premiado a nível nacional e internacional, deve-se à dedicação de milhares de bolseiros e investigadores nos últimos dez anos. Os bolseiros asseguram a maior fatia da investigação produzida, asseguram uma parte substancial das necessidades de docência das universidades, muitas vezes a título “voluntário”, e asseguram uma série de outras funções, incluindo administrativas.

Apesar disso, os bolseiros de investigação científica são um alvo geralmente invisível da precariedade laboral. Os bolseiros de investigação são jovens recém-licenciados, mas são também investigadores altamente experientes de pós-doutoramento. São mães, pais, jovens e menos jovens, que vivem com “contratos” de bolsa a 3, 6 ou 12 meses. Em Portugal, os bolseiros, não progridem na carreira (porque a carreira não existe), não têm direito a contrato de trabalho e os seus vencimentos não são atualizados há mais de 10 anos. Os bolseiros não estão protegidos socialmente quando as bolsas terminam.

Somos, simultaneamente, a população mais qualificada de sempre e, por comparação, a mais precária: nunca os licenciados e doutorados representaram uma percentagem tão elevada dos desempregados. O nosso futuro é incerto e muito abaixo das legítimas expectativas de quem procurou na educação uma ferramenta para se tornar um cidadão e um profissional mais competente, servindo com isso o país. Não fomos nós que falhámos: foram as governações pautadas pela ausência de políticas de incentivo, fiscal ou outro, à criação de um mercado laboral capaz de absorver estas competências que falharam – falhando-nos a nós e ao país.

Não pedimos que resolva tudo isto de imediato, apenas que dê resposta às questões mais urgentes.

Neste último ano tem-se verificado um aumento de situações gravosas para os bolseiros de investigação afetos a projetos financiados pela Fundação para Ciência e Tecnologia (FCT), que decorrem de irregularidades no fluxo financeiro entre a FCT e as entidades gestoras dos projetos.

Este facto levou à situação inédita de se renovarem contratos de bolseiros de projeto a 3 meses, em projetos aprovados pela FCT para períodos iguais ou superiores a 12 meses: é o que acontece atualmente na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Não é possível planear ciência a 3 meses em projetos pensados e aprovados para períodos superiores. Principalmente, não é possível pedir a mães e pais e filhos que vivam a três meses.

A diminuição dos fluxos de pagamentos da FCT para as entidades gestoras tem condicionado também a execução dos projetos, impedindo a sua plena concretização, penalizando a produtividade dos grupos de investigação e as avaliações futuras dos seus elementos.

Assiste-se, paralelamente, a um agravamento dramático em relação aos anos anteriores dos atrasos no pagamento de novos contratos de Bolsas Individuais de Doutoramento, que já se fixa em quase 6 meses; assiste-se a atrasos nas renovações anuais de bolsas de doutoramento e de pós-doutoramento; e, finalmente, assiste-se a atrasos substanciais nos reembolsos dos pagamentos das prestações do Seguro Social Voluntário.

Os investigadores, bolseiros de investigação, presidentes de Centros de I&D e restantes cidadãos consideram que esta situação não é compatível com a dignidade, o esforço e o mérito daqueles que asseguram a investigação científica e tecnológica do país, e sublinham que ela inviabilizará, a curto prazo, uma condição fundamental para a sua recuperação económica e social: a produção científica e tecnológica. Por esse motivo, os signatários desta carta consideram fundamental que sejam tomadas as seguintes medidas:

1. A regularização do fluxo de verbas da FCT para as entidades gestoras, de forma a permitir a plena execução dos projetos;

2. Que a FCT dê prioridade à análise da rubrica "Recursos Humanos" (Bolsas), quer para Bolsas Individuais, quer para as bolsas associadas a projetos, dado que essas verbas se encontram autorizadas e orçamentadas desde a aprovação do Projeto/Plano de Trabalhos;

3. Que se proceda aos pagamentos em atraso do Seguro Social Voluntário imediatamente;

4. Que se melhore o serviço de atendimento telefónico e de correio eletrónico da FCT, permitindo àqueles que não residem em Lisboa resolver os seus problemas com celeridade;

5. Que o Senhor Ministro da Educação e Ciência interceda junto do governo, para que este assuma como prioritária uma política de incentivos conducente à criação de emprego que absorva a mão-de-obra altamente qualificada e o seu saber.

 

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Clique para ver os signatários ou assinar a petição.