Um hotel sul-africano teve uma ideia genial: reproduzir um bairro de barracas. Daqueles onde uma parte muito substancial da sua população vive. O hotel promete uma experiência única no seu espaço miserável privado, onde a casa de banho fica na rua e o cliente tem de aquecer a água no fogo que ele próprio faz. Os quartos-barraca, para clientes "extravagantes", custam 61,5 euros por dia. Não se assuste. Têm o chão aquecido e wireless. Radical, mas sem exageros.
O site do Emoya Luxury Hotel dá-nos o devido enquadramento: "Milhões de pessoas vivem em bairros informais na África do Sul. Esses bairros consistem em milhares de casas, conhecidas como Shaks, Shantys ou Makhuhus." Depois de explicar as péssimas condições físicas em que se vive nesses bairros, que ali são reproduzidas, fica o desafio: "agora, pode experimentar ficar numa Shanty num ambiente seguro". É excelente para "team building", festas temáticas ou simples experiência. E é "child friendly".
Tornaram-se habituais, no Rio de Janeiro, as visitas guiadas às favelas. Essas, ao menos dão algum dinheiro a ganhar a quem lá vive. Seja como for, por todo o lado o turismo diversifica a sua oferta. E os safaris, para conhecermos os animais selvagens no seu habitat natural, vão sendo substituídos pela experiência da pobreza, podendo, em vários casos, o visitante conviver com os miseráveis sem que estes vivam em cativeiro. Não desesperem. O turismo em prisões virá logo a seguir.
Não farei grandes divagações morais sobre a comercialização e estetização da pobreza, para divertir uma classe média ocidental enfadada e à procura de sensações fortes. Até porque, neste caso, é só o simbólico da coisa que incomoda. Não farei grandes considerações sobre o turismo humanitário, o turismo revolucionário, as experiências sociais de verão e todo esse filão comercial que nos oferece a ilusão de conhecemos o que nos é estranho, dando-nos vidas falsas para depois voltarmos às nossas intactos. Apenas concluo o evidente: o capitalismo mantém uma capacidade extraordinária de transformar tudo em dinheiro. Até as revoluções são um bom negócio - haverá brand comercialmente mais atrativo do que o de Che Guevara? Agora, chegou a vez de fazer dinheiro com a falta dele. Nada se perde, nada se cria, tudo se vende. E como não há má publicidade, o esgoto é o limite.
Publicado no Expresso Online
NOTA: ficam as minhas desculpas pelo erro na publicação deste post. Está corrigido.