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Arrastão: Os suspeitos do costume.

Falar à esquerda

Miguel Cardina, 20.02.11

Merecem reflexão algumas considerações surgidas após o anúncio da apresentação da moção de censura do Bloco de Esquerda. De facto, podemos levantar dúvidas sobre a oportunidade táctica e a forma como decorreu o processo interno e externo de apresentação da iniciativa. Podemos até achar – como há dias o Público afirmava em editorial e como argumentou ontem Elísio Estanque na mesma publicação – que o BE navega num limbo indeciso entre a vontade de ser um partido de poder e a tentação de ser um partido de protesto (se bem que neste caso me pareça de definir, antes de mais, o que entendemos por «poder» e por «protesto»). O que já se mostra incompreensível é a desilusão de alguns socialistas com a iniciativa bloquista, por um lado, e a catalogação da moção como «ridícula» por ter como destino provável a rejeição e a consequente manutenção de Sócrates no governo, por outro. Vamos então por partes.

 

A desilusão dos socialistas resulta, a meu ver, de uma caracterização equivocada daquilo que é o PS actualmente. Não penso que se possa caracterizá-lo tout court como social-democrata, logo, como o parceiro certo e inteiro numa coligação com uma esquerda que frequentemente se cataloga como «radical». Muitos sectores socialistas são-no, certamente, mas basta olhar para a geometria das preferências de diálogo parlamentar para se perceber que o PS há muito se afastou da matriz histórica da social-democracia. Compreendo a frustração: para algumas pessoas, o BE poderia ser uma hipótese de pôr o PS nos eixos da social-democracia. Mas esse é um combate que compete travar aos militantes socialistas nele interessados. Aqueles que esperavam do Bloco de Esquerda uma postura que facilitasse um «entendimento útil» com o PS deviam, antes de mais, começar por perguntar o que fez de concreto este partido para que pudesse haver convergências à esquerda. E já que se quer falar de entendimentos seria fundamental pensá-los com base em linhas políticas de fundo: sobre o estado social, sobre as políticas de emprego, sobre o combate à pobreza e às desigualdades, sobre a Europa, sobre uma ética na gestão dos bens públicos. O poder será resultado da capacidade de fazer compromissos em torno de debates como estes ou então não valerá a pena.

 

Em segundo lugar, as declarações do PSD já vieram mostrar que esta moção de censura será chumbada no hemiciclo. Tal não me parece justificar, porém, alguma adjectivação que sobre ela caiu de imediato. A política é mais do que a contabilidade das cabeças parlamentares e uma moção de censura pode perfeitamente ser a oportunidade de recusa de um caminho – recusa essa que ganha acrescida legitimidade se fizermos o exercício de comparar as práticas deste governo com o programa eleitoral com que se fez eleger – e a afirmação de um outro rumo que se considere mais sintonizado com as reais preocupações do país. Aliás, se uma moção apenas fosse válida caso tivesse condições para ser aprovada seríamos obrigados a considerar ridículas todas as moções apresentadas a executivos maioritários. E muitas das mais de vinte moções de censura já apresentadas desde 1979 foram-no nessa condição. O próprio José Sócrates foi alvo de quatro moções de censura na altura em que tinha maioria absoluta.

 

A política faz-se da afirmação de escolhas e o BE decidiu fazê-las agora. Podemos questionar o timing, mas quem se considera de esquerda facilmente concordará que são muitas as razões que dão sentido ao gesto. Ontem o PCP reforçou isso mesmo, anunciando o voto favorável à moção. A direita preferirá manter Sócrates no poder esperando que ele caia de podre. Incapaz de se desembaraçar do seu líder-eucalipto, o PS permanecerá agarrado aos destroços, fortemente inclinado ao centro e corroído por anos de poder. E o problema aqui não é o “poder”, claro está. É a urgência de entendê-lo como capaz de forjar políticas mais justas, mais decentes e, já agora, desobrigadas das promiscuidades que entrelaçam o campo político e o campo económico. Não é disso que falamos quando falamos de esquerda?

3 comentários

  • Sem imagem de perfil

    Teixo 21.02.2011

    Luia, o Rui Tavares foi eleito como independente.
    O resto da sua prosa é uma série de palermices que mete dó.
  • Sem imagem de perfil

    Rui M 21.02.2011


    Palermices que mete dó?

    O R Tavares é dos poucos que estão actualmente no Bloco que consegue ser Politicamente racional.
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