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Arrastão: Os suspeitos do costume.

Contra a reacção

Sérgio Lavos, 06.03.11

 

Fez-se história. Dezenas de anos depois, uma música com suficiente interesse ganhou o Festival da Canção e irá representar a pátria - ah, que gozo dá escrever isto - lá fora. Para cúmulo, no país de Merkel, o foco de todas as desgraças lusas. Para mais, a vitória foi conseguida graças ao voto dos espectadores, que contrariou o voto dos "especialistas" que tinham escolhido mais mais uma canção abaixo de cão, a caminho dos últimos lugares do Festival da Eurovisão (sim, eu de vez em quando espreito o festival). Poder-se-à dizer que o Festival da Eurovisão é o grau zero da música. Certo, e a realidade não desmente esta impressão. Mas entre a mediocridade enfatuada dos habituais, a parvoíce das péssimas letras - sempre à volta da ideia do "amor", ou da "alma lusa", ou do "fado" - e a pobreza mais do que franciscana das composições, e a mediania irónica da canção dos Homens da Luta, como não escolher a segunda? O maior feito desta dupla de humoristas foi ter dinamitado uma instituição da incompetência pátria, o nacional-cançonetismo, instituição muito mais do que simbólica (em tanta participação, o melhor que conseguimos foi para aí um 8.º lugar), no seu próprio terreno; a música dos Homens da Luta é primeiro um pastiche da música de intervenção - e por isto há muita gente de esquerda que não gosta deles -, mas o happening em que se tornou a sua participação no festival - as referências ao castiço nacional, as caricaturas do "povo", e depois a reacção do público à sua vitória, devidamente enfatizada pelo discurso de Jel - fez com que o acontecimento fosse uma inteligente desconstrução de algo perfeitamente anacrónico. Como não preferir a caricatura voluntária à involuntária? Os trabalhadores postiços às mulheres das sete saias da primeira canção?

 

Outro feito dos Homens da Luta foi terem conseguido que gente que poderia sentir-se ofendida com a caricatura se tenha de imediato colado a esta pequena vitória; na hora em que se contam espingardas contra o Governo, tudo conta (é espreitar o 5 Dias, para se confirmar). Por outro lado, a caixa de ressonância do Governo na blogosfera rapidamente veio anunciar o nojo que sente perante tal ofensa - ao Governo, presumo. Ah! Ah! Não me divertia tanto há algum tempo, confesso. E a procissão ainda vai no adro, a caminho da Alemanha. A luta é mesmo alegria.

3 comentários

  • Sem imagem de perfil

    da Maia 07.03.2011

    E provavelmente uma boa parte votou no Coelho nas últimas presidenciais!


    Quem disse que os portugas não têm sentido de humor, e não sabem enviar mensagens ao sistema?


    É uma excelente ideia ir buscar os fantasmas que uma esquerda carregou, mas que arrumou no armário. 
    Onde já lá vai o "soldado de Abril", e quem ouviu falar mais da "Catarina Eufémia"?


    Eu adorei a mistura Village People, que ataca a direita usando os fantasmas já enterrados pela esquerda. 
    É uma dupla crítica, contra todo o regime... tal como a crítica que fazem aos sindicalistas, que vivem da luta... colaborando com o regime.
    Neste vídeo 
    http://www.youtube.com/user/VaiTudoAbaixoTV#p/u/1/NZdmpmwMQR8 (http://www.youtube.com/user/VaiTudoAbaixoTV#p/u/1/NZdmpmwMQR8)


    vemos o Jel a perguntar ao João Proença "não fez greve hoje?", enquanto este se dirigia para apoiar a moção de Sócrates.
    Depois, vemos ainda os pontapés do regime, etc... 


    Mas sobretudo vemos a poderosa ocultação, já que estas coisas até nos facebooks... "grandes divulgadores" têm sempre dificuldade em passar de boca em boca.
  • Sem imagem de perfil

    Antonio Cunha 07.03.2011

    E vemos também, a caricatura aos comunistas e demais sindicalistas que muitas vezes se esquecem do que realmente interessa.
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