Trabalhando
Um estudo da OCDE divulgado ontem notava que o trabalho não remunerado correspondia em Portugal a 53% do PIB. Os portugueses – ou melhor, as portuguesas – gastam perto de quatro horas diárias em tarefas não remuneradas mas indispensáveis à sociedade: cozinhar, lavar a roupa e passar a ferro, cuidar dos filhos. Entendo como um avanço civilizacional a saída da invisibilidade destas actividades, mas acho que os dados devem fazer-nos perseverar numa série de exigências políticas, que devem ir de campanhas pela conciliação entre vida familiar e vida profissional até à exigência de creches públicas e acessíveis a todos os extractos sociais, passando pela luta contra as inconstitucionais diferenças salariais em função do sexo e pela denúncia dos “telhados de vidro” que ainda existem na ascensão profissional das mulheres.
Mas penso noutra coisa. E se de repente confrontássemos o nosso conceito de “trabalho” com uma série de actividades que desempenhamos, conhecemos ou usufruímos e nos questionássemos: será isso trabalho? E que ilações tiraríamos se respondêssemos positivamente? Cuidar de familiares, vizinhos ou amigos é trabalho? Redigir um artigo de opinião para um jornal é trabalho? Levar a bom termo uma gravidez é trabalho? Ensinar música, participar num grupo de teatro amador ou dinamizar um clube desportivo é trabalho? Ler o e-mail é trabalho? Estudar é trabalho? Estagiar sem remuneração é trabalho? Desenvolver uma actividade sexual remunerada é trabalho? Escrever num blogue é trabalho?