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Arrastão: Os suspeitos do costume.

Um Estado volúvel

Daniel Oliveira, 09.01.12

 

 

Com apenas quatro anos de vigência a lei do tabaco vai ser de novo alterada. Imagina-se que uma lei que afecta os negócios de milhares de pessoas com estabelecimentos comerciais a liberdade (sempre limitada, como todas as liberdades) de milhões de cidadãos e a saúde de todos resulte de profundas e cuidados negociações. Dessas negociações nascerão as regras de convivência entre todos nós. Tendo em conta interesses contraditórios. Depois dá-se tempo ao tempo para saber se a lei tem os efeitos pretendidos. Assim deveria ser. Assim não é.

 

Em Portugal legisla-se, muitas das vezes, para ter notícias. E sempre que um governo não tem boas notícias para dar a fúria higienista faz-se sentir. Ela sai da borla e satisfaz muita gente. Assim como os exorbitantes impostos sobre o tabaco, dirigem-se a uma minoria de culpados, viciados e, por isso, pouco reivindicativos consumidores.

 

Não vou aqui perder muito tempo a dizer o óbvio: que a existência de restaurantes sem espaço para fumadores (a esmagadora maioria dos estabelecimentos) e com espaço para os ditos já garantia o que se pretendia - o direito dos não-fumadores a não consumirem o tabaco dos outros. Mais do que isto é, como se tem tornado num hábito de muitos Estados, querer policiar o que os cidadãos fazem com o seu próprio corpo.

 

Fico-me por um tema mais prosaico. Foi dito aos donos de espaços de restauração que se queriam ter espaços para fumadores (e assim garantir essa clientela) teriam de fazer um avultado investimento em exaustão de fumo e separação de espaços. Uns decidiram, com base na nova lei, fazer esse investimento. Gastaram o dinheiro, seguiram as normas, foram fiscalizados e cumpriram a lei. Quatro anos depois, o Estado diz-lhes: podem oferecer o equipamento em que investiram para a sucata porque afinal muda tudo de novo.

 

É difícil, perante um Estado que se comporta assim, pedir aos cidadãos que acreditem nele e levem as leis a sério. Esta forma de legislar para os jornais, como se o País começasse do zero de cada vez que um novo governo chega ao poder, é um convite aos cidadãos: não cumpram as leis, não respeitem a autoridade do Estado. As leis são para durar uns meses, a autoridade do Estado é tão volúvel como a de um adolescente mimado.

 

Publicado no Expresso Online

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