Jorge Palinhos
Pessoal do Arrastão, os termos do inquérito parecem-me um bocadinho simplistas, até porque a maioria das pessoas não faz ideia como funcionam as atribuições de financiamento às artes ou como é a economia das artes performativas em Portugal. Seria melhor contextualizar com alguns posts.
Posso deixar aqui um excerto de um post meu que talvez ajude a perceber melhor as coisas:
«Suponhamos um "À espera de Godot" numa sala de 100 lugares do Bairro Alto, durante um mês (cerca de 20 apresentações), sempre com a casa cheia, com cada espectador a pagar um bilhete de 10 euros. Ou seja, uma receita máxima de 20 000 euros (isto na remota possibilidade de não haver descontos para estudantes, idosos, escolas e grupos de 10 pessoas).
Será que 20 000 euros dão para pagar os direitos de autor, a tradução, o aluguer da sala, a luz da sala, a limpeza e água das casas-de-banho, os quatro actores, o encenador, o figurinista, a costureira, o cenógrafo, o carpinteiro, o técnico de luz, o técnico de som, o compositor, os músicos, o electricista, os produtores e os operadores de máquinas – já para não falar dos materiais para o cenário e guarda-roupa e restante equipamento. E isto durante os dois meses que demora a montar uma peça mais o mês em que ela é apresentada?
Os apoios do Estado às artes performativas têm apenas dois objectivos: fazer com que cada bilhete custe menos de 100 euros, tal como custam na Broadway e em West End (e mesmo aí as peças demoram, em média, 5 a 10 anos para recuperar o investimento), e permitir que não haja só teatro de revista e imitações de musicais americanos. Aliás, note-se que o grande “empresário de sucesso” da cultura em Portugal, Filipe La Féria, tem cronicamente os salários e pagamentos a fornecedores em atraso.»