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Arrastão: Os suspeitos do costume.

O caminho da perdição

Sérgio Lavos, 08.07.13

 

A tese, lançada por Manuela Ferreira Leite, de que a saída de Vítor Gaspar do Governo teria a ver com uma calamidade ainda maior que o Governo nos estaria a esconder, teve ontem a sua confirmação.

 

Curiosamente, teve de ser um jornal espanhol, o El Pais, a fazer a investigação que competiria à imprensa nacional. Mas adiante - não devemos exigir demasiado aos nossos jornalistas, coitados. A verdade é que há semanas que o Governo negoceia um segundo resgate com a Comissão Europeia. Podem chamar-lhe "resgate brando" ou outro qualquer eufemismo orwelliano, mas será sempre um segundo resgate - Portugal não conseguirá regressar aos mercados sem ajuda das instituições europeias. Pior, as medidas de austeridade, a contrapartida exigida aos países "resgatados", vão continuar, provavelmente aprofundar-se, num desastre social sem fim à vista.

 

Nas costas dos portugueses, o Governo negoceia as condições do seu fracasso. Quando surgir a confirmação da negociação do segundo resgate, o spin governamental encarregar-se-á de espalhar a palavra: irá ser dito e redito que este segundo resgate não só não é, na realidade, um resgate, como é resultado dos sucessos da política económica e da credibilidade conquistada. Muitos acreditarão - ou vão querer acreditar nisso. Mas a verdade é que entrámos numa espiral recessiva que está a destruir a economia, e sem crescimento económico nunca conseguiremos pagar o que devemos, seja aos mercados, seja à troika. O resultado de dois anos a destruir a economia é que... não temos economia para pagar o que devemos. A aplicação da austeridade em Portugal é como o paradoxo de Aquiles e da tartaruga, de Zenão: quanto mais é cortado, menos dinheiro há em circulação, menos produzimos, e a meta fica mais distante. No entanto, temos de pagar o mesmo que tínhamos antes. Isto é, temos menos dinheiro - PIB inferior - para pagar exactamente o mesmo. Mais os empréstimos da troika; este e os que se seguirão.

 

Tudo isto estava escrito nas estrelas. Inúmeros economistas e comentadores dizem há dois anos que tudo iria desembocar neste pântano sujo e fétido. E o pior nem é a economia - nunca é. É o retrocesso democrático que está associado este perigoso período da nossa História. Temos menos liberdade, são constantes os atropelos ao Estado de Direito e à lei fundadora do regime - a Constituição -, suspendemos a soberania e, portanto, o poder de decidir o nosso destino e, pior, cada vez mais vozes defendem que as regras da democracia têm de ser subvertidas por causa do resgate. Quando se tenta a todo o custo evitar eleições, quando se olha para eleições como um inconveniente ao funcionamento do país, perdemos muito, quase tudo. Neste momento, vivemos efectivamente uma ditadura de quatro anos, à maneira de Roma Antiga; temos um Governo que não cumpriu uma promessa que fosse do seu programa eleitoral, um Governo destroçado por tricas e vergonhosas lutas de poder, um Governo que destruiu toda a legitimidade conferida pelas eleições, mas não podemos abdicar dele por causa dos "mercados". Estes são tempos negros. E pode ser apenas o princípio.

5 comentários

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    Anónimo 08.07.2013

    "...se a lei fundadora e tantas outras impõem um regime que nos leva à falência, é bem claro que há que mudar ou a lei ou o regime! "


    Se para tirar o país da falência for necessário passar por cima dos direitos humanos acha que o devemos fazer?
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    JgMenos 08.07.2013

    Antes que possa ter uma resposta, tem que definir o problema:
    São direito individual, ou dever da comunidade de criar as condições favoráveis a que possam realizar-se os direitos: ao trabalho, à habitação, à saúde, à educação?


    Direitos humanos são uma longa cartilha que tirando o direito à vida e à liberdade não são mais que tudo um plano de acção política (organização da polis); e aí sempre o dever acaba por se conformar com o poder.


    Mas de direitos temos 39 anos de exaltação cultural.
    Estou mais preocupado que se entenda que 'dever da comunidade' é, antes de mais, deveres para todos, e não direitos sobre o Estado!
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    Anónimo 09.07.2013

    porque optou por não responder à minha pergunta?
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    JgMenos 10.07.2013

    Foi plenamente respondida:
    É inaceitável que se mate ou prenda; quanto ao resto
    far-se-à o que for possível fazer-se.
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