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Arrastão: Os suspeitos do costume.

Os lugares-comuns

Daniel Oliveira, 18.02.05
AS COISAS funcionam assim: um comentador afirma. O político repete. O jornalista reproduz muitas vezes. O humorista transforma em caricatura. E o povo começa a dizer na rua. Passamos a ter um facto indesmentível, mesmo que todos os factos o desmintam.

Alguns exemplos do passado: o CDS estava morto e só esperava a primeira oportunidade para fazer a fusão com o PSD. Santana Lopes era imbatível em campanhas eleitorais. José Sócrates, graças à sua imagem enérgica e moderna, iria ser apelativo para jovens e urbanos. A tomada do poder no PCP pela linha ultradura iria fechar o discurso do partido, cercado pela má vontade da comunicação social. O Bloco de Esquerda estava confinado ao voto urbano levezinho, amigo das causas fracturantes, incapaz de compreender os sentimentos da maioria dos portugueses e destinado a ser um partido residual.

Tudo certezas indesmentíveis. Todas desmentidas. Portas está em grande, Sócrates é cinzento, Santana uma tragédia em campanha, Jerónimo goza da condescendência socialmente preconceituosa dos jornalistas e é na sua fraqueza que vai buscar simpatia, Louçã é dos líderes mais populares.

Tudo diferente, fazem-se novos retratos: Portas teve os ministros mais competentes e é imbatível, Santana nunca acerta uma e é amador, Sócrates nunca diz nada, Jerónimo é diferente de todos porque sendo fraco é humano, Louçã é um moralista.

Por que é que as opiniões se fazem por ondas e se contradizem a cada momento, mesmo quando, em Portugal, são sempre escritas e ditas pelas mesmas pessoas? Por preguiça. A opinião, em Portugal, pouco mais faz do que repetir chavões. Não tem memória nem se baseia em nada. Ninguém lê os programas políticos, poucos conhecem a história e a base social dos partidos e, na ignorância, mais vale repetir lugares-comuns.