Os náufragos
Daniel Oliveira, 23.07.05
SEGUNDO a lei portuguesa, uma criança que nasça em solo português e seja filha de imigrantes é estrangeira na sua própria terra. Nunca conheceu outro lugar, não fala outra língua, mas todos lhe dizem, desde o dia em que nasce, que este não é o seu país. Ao mesmo tempo, um filho de um português nascido e criado no estrangeiro, que nunca aqui tenha estado, tem garantida, graças à pureza do sangue pátrio, a nacionalidade.
O Governo vai mudar a lei, mas a nacionalidade originária continua a ser vedada aos filhos de estrangeiros. O direito de solo, que até 1982 dominava a lei portuguesa, continua a ter de conviver com o direito de sangue, tão querido às mais tenebrosas ideologias do século XX. O bom exemplo americano, que se orgulha da diversidade de origens dos seus cidadãos, continua a encontrar resistência nos espíritos das nações europeias.
A identidade nacional apenas nos confina à pequenez da memória e ao absurdo da pureza étnica. O multiculturalismo apenas transforma as nossas sociedades em supermercados de culturas que não se tocam. Só uma cidadania cosmopolita, com base em direitos e deveres iguais, pode garantir a integração. Seja qual for a nacionalidade, que sejam todos mestiços, vagamente portugueses, vindos de todo o lado. Todos imigrantes no lugar onde nascerem ou viverem. Se não for assim, haverá sempre milhares de adolescentes que, na busca da sua identidade, descobrirão que não são de lugar nenhum. Nem de cá nem de um outro lugar mítico que nunca conheceram. Serão náufragos em terra firme. Desesperados.
O Governo vai mudar a lei, mas a nacionalidade originária continua a ser vedada aos filhos de estrangeiros. O direito de solo, que até 1982 dominava a lei portuguesa, continua a ter de conviver com o direito de sangue, tão querido às mais tenebrosas ideologias do século XX. O bom exemplo americano, que se orgulha da diversidade de origens dos seus cidadãos, continua a encontrar resistência nos espíritos das nações europeias.
A identidade nacional apenas nos confina à pequenez da memória e ao absurdo da pureza étnica. O multiculturalismo apenas transforma as nossas sociedades em supermercados de culturas que não se tocam. Só uma cidadania cosmopolita, com base em direitos e deveres iguais, pode garantir a integração. Seja qual for a nacionalidade, que sejam todos mestiços, vagamente portugueses, vindos de todo o lado. Todos imigrantes no lugar onde nascerem ou viverem. Se não for assim, haverá sempre milhares de adolescentes que, na busca da sua identidade, descobrirão que não são de lugar nenhum. Nem de cá nem de um outro lugar mítico que nunca conheceram. Serão náufragos em terra firme. Desesperados.