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Arrastão: Os suspeitos do costume.

A democracia estará à altura

Sérgio Lavos, 27.09.13

 

A três dias das eleições, as sondagens para as autárquicas têm vindo a mostrar que as pessoas parecem estar a acordar da letargia. Há dois meses, parecia que o PSD poderia reclamar vitória no próximo domingo, apostando apenas na inércia e na fraca oposição do PS. Mantendo as expectativas muito baixas - com a ajuda da maioria dos comentadores e da opinião publicada -, bastaria ao Governo perder por pouco e conquistar duas ou três câmaras importantes para sair das eleições reforçado. Mas as últimas semanas têm vindo a mostrar que as coisas podem não correr exactamente como o PSD esperava.

 

O que terá mudado? Primeiro, António José Seguro. Andou um pouco por todo o lado e apostou em tudo menos falar de política local, transformando a campanha num referendo ao Governo - a eleição possível depois de Cavaco Silva ter decidido manter em funções a moribunda coligação. A dramtização terá sido uma táctica acertada. Pedro Passos Coelho parece mais perdido do que nunca, num dia acenando com o fantasma de um terceiro resgate, no outro afirmando sem se rir que o país está no bom caminho. Paulo Portas, afastado das feiras e das praças, onde se sentia como submarino dentro de água, é, e será para sempre, o irrevogável, o homem sem nenhuma cara. No fundo, os dois líderes dos partidos do Governo não passam de mortos-vivos a comandar um Governo que já acabou em Julho passado.

 

Mas o que mudou, sobretudo, foi a percepção geral das pessoas. A boa campanha de Seguro ajudou, mas houve algo que poderá ter contribuído ainda mais para esta ideia: o desastroso início de ano lectivo. Pode parecer um assunto de menor importância, mas na realidade não é. Ao tocar naquilo que qualquer cidadão tem de mais sagrado - os filhos - o Governo, pela mão de Crato, cometeu um erro crasso. É que toda a gente sabe o que está a acontecer nas escolas diariamente. Mesmo tendo o assunto desparecido das televisões e dos jornais, a verdade é que ainda há milhares de horários sem professor, confusões gigantescas, escolas com falta de funcionários. E as pessoas já não engolem as falinhas mansas do ministro do rigor e da exigência.

 

Um exemplo, apenas: na turma do meu filho, ainda não há professor de inglês (6.º ano). Hoje, na primeira reunião de encarregados de educação, havia indignação geral por esta situação, e também pela falta de funcionários - reformaram-se seis e não foram substituídos - que leva a que o bar não esteja aberto durante a hora de almoço. A directora de turma, que tinha estado todo o dia a entrevistar professores candidatos à disciplina de Educação Musical, pôs as coisas como estão efectivamente a ser sentidas por professores, funcionários e pais: este está a ser o pior início de ano lectivo em muito, muito tempo. Uma mãe, a meu lado, mostrava-se incrédula com o discurso de negação de Crato, que continua a afirmar que tudo está a correr normalmente. As pessoas podem ser ingénuas durante algum tempo, mas não são parvas para sempre. 

 

No próximo domingo, assistiremos a uma derrota do PSD um pouco por todo o país. Mesmo que o PS não conquiste as câmaras com que sonha, a esquerda no seu todo sairá fortemente reforçada. A CDU "corre o risco" de reconquistar autarquias que não ganhava há décadas e o BE deverá crescer no total de votos. No final da noite, certamente que os partidos do Governo não assumirão a derrota. Muito menos irão tirar consequências dos resultados, como se depreende do que disse Pedro Passos Coelho, prometendo não sair mesmo que o PSD seja derrotado. Essa promessa, sabemos muito bem, é uma maldição para o país. Mas a força do povo, mais cedo ou mais tarde, fará cair este Governo de perdição nacional. Com a democracia não se brinca. 

Péssima notícia

Daniel Oliveira, 19.02.08
O Tribunal de Contas recusou dar o visto prévio ao empréstimo de 360 milhões de euros que a Câmara de Lisboa pretendia contrair. Começa a gestão da crise para António Costa, que adiou uma viagem aos EUA. O dinheiro é crucial para a Câmara de Lisboa pagar aos seus fornecedores, evitando que a cidade fique paralisada.

Uma péssima notícia para a cidade de Lisboa e para os muitos pequenos fornecedores da Câmara. O preço da passagem de Santana Lopes e Carmona Rodrigues pela Câmara de Lisboa será muito alto. Mas também não deixa de ser irónico que seja a lei das Finanças Locais, de que Costa é um dos autores, a impedi-lo de dirigir a autarquia. Esperemos que PSD e Carmona tenham a decência de assumir as suas responsabilidades.

Estabilidade, coerência política e qualidade técnica

Daniel Oliveira, 20.01.08
O José Reis Santos defende a lei aprovada para mudar as eleições autárquicas. Argumentos:

1. «A nova lei subentende que a boa governação necessita estabilidade executiva, e por isso «constrói» executivos fortes. E em teoria não está errada; pois a execução da política pública sufragada deve poder ser possível. Ou seja, quem for eleito deve ter a possibilidade de executar o seu programa eleitoral.»

Mais de 80% das autarquias são governadas por maiorias absolutas. Ou seja, a lei não precisa de resolver o que o eleitorado, em liberdade, resolve. Em mais de 2700 eleições autárquicas para Câmaras Municipais houve 10 eleições intercalares. Destas, cinco foram em executivos com maioria absoluta. Não só não há instabilidade nas câmaras, como a queda de executivos parece não resultar de falta de maiorias.

2. «Imaginem que há um presidente de Câmara com vereadores da oposição no executivo. Com pelouros. Qualquer relação política que poderão desenvolver terá de ser limitada, pois ambos defendem projectos políticos diferentes. E como se resolvem os conflitos? Por acordos, que muitas vezes ultrapassam os actores locais para serem decididos pelas direcções nacionais. Sempre fora dos olhares dos eleitores, que apenas assistem. »

Respeitando a democracia, temos de reconhecer que as poucas vezes que os eleitores não dão maioria absoluta a um executivo é ou porque preferem que governe em coligação ou é porque não o acham merecedor de tanto. A regra democrática é aquela que limita o poder na exacta medida em que o eleitor quer que ele esteja limitado. Legislar para tirar esse poder ao eleitor pode parecer excelente a quem governa, mas é retirar das mãos de quem vota o poder de definir como se governa. Se o eleitorado achar que a falta de governabilidade é um problema tem (e no caso português, como demonstram os resultados, o sistema eleitoral até já o favorece) a solução nas suas mãos. Ainda assim, haveria mudanças possíveis que favorecessem coligações claras (e não entrega de pelouros a quem continua a ser formalmente oposição). Não foi essa a opção. O que me leva a pensar, por toda a argumentação de Reis Santos, que ele defende que o que se está a propor para as autarquias deve também acontecer nas eleições legislativas: forçar maiorias absolutas mesmo quando elas não existam por vontade dos eleitores.

3. «O mesmo acontece na restante escada hierárquica, ao nível das directorias. Faz algum sentido que director A de partido B vá executar a política de partido C? o que o impede de boicotar a implementação das directrizes recebidas? O que o impede de favorecer o seu partido?»

Reis Santos parte do princípio (verdadeiro, mas felizmente nem sempre) de que os directores representam o partido A ou B ou C. Eu, que acho que os directores devem ser escolhidos por confiança política, defendo que ela não tem de corresponder a confiança partidária e que a confiança técnica e profissional também tem de contar. Nenhum técnico competente aceita um cargo para boicotar resultados. Ou seja, se nomeamos um director competente sabemos que ele ou recusa a nomeação ou implementa as medidas propostas. Se não, enganámos-nos na sua competência. Ou seja, na confiança política perante um técnico a competência técnica é o elemento chave de avaliação. O problema é que os eleitos ou não estão dispostos a quebrar o circulo vicioso da nomeação partidária (e não política) de incompetentes ou, sendo eles próprios politicamente incompetentes, fazem-se substituir nas suas competências políticas por técnicos não eleitos. E isso não há lei eleitoral que resolva. Só mesmo uma mudança de cultura política: que os eleitores elejam políticos com competência política e que os políticos nomeiem técnicos com competência técnica. E sobre isto não se legisla.

Gostava que o meu caro amigo Rei Santos comparasse a qualidade do trabalho de executivos com maioria absoluta e sem ela e que me dissesse se nota alguma diferença fundamental.

Para quê?

Daniel Oliveira, 17.01.08

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Uma lei eleitoral muda-se quando tem mesmo de ser. São necessárias décadas para que os eleitores a compreendam, a usem com objectivos que devem ser respeitados (umas vezes garantir estabilidade, outras impedir abusos de poder, umas garantir a continuidade, outras regenerar os cargos políticos) e para se sentirem confortáveis com ela. Era necessário mudar a lei eleitoral autárquica? Vejamos:

A lei actual impede estabilidade nas câmaras? Todos os dados demonstram o contrário. Em mais de 2700 eleições autárquicas não deve te havido mais do que uma dezena de eleições intercalares. A maioria das câmaras, com o actual sistema eleitoral, é governada por maiorias absolutas, por vontade dos eleitores. Esta lei, ao definir que a lista mais votada tem a maioria absoluta dos vereadores diz tentar resolver um problema que realmente não existe. Na realidade, apenas tenta manipular os resultados para reduzir o peso da oposição. E cria situações caricatas. Diz a proposta que as câmaras terão doze, dez, oito, seis ou quatro vereadores, dependendo da população. Apesar de reduzirem o número de vereadores dão a todos os partidos da oposição, mesmo que eles representem (como acontece em Lisboa) mais de 70% dos votos, até cinco, quatro, três, dois ou um vereador, respectivamente. Em Lisboa, o PS, que tem seis vereadores em 17, passaria a ter sete em 12 mais o presidente. Pode dar-se este o absurdo: imagine-se um concelho com menos de 10 mil habitantes (que elege quatro vereadores) em que, por exemplo, o PS tivesse pouco mais de 30%, o PSD 30% e o PCP pouco menos de 30%. O PS elegeria três vereadores mais o presidente, o PSD elegeria um vereador e o PCP não elegia nenhum.

A lei actual afasta o eleito do eleitor? Se sim, com a nova lei isto agrava-se. Não apenas porque ela distorce os resultados das eleições, mas também porque os vereadores não são na realidade eleitos para o cargo. Na lei proposta, os vereadores da maioria (os que vão governar) são escolhidos pelo presidente entre os eleitos da Assembleia Municipal. Podem ser distintos anónimos entre as dezenas de eleitos.

A lei actual dá excesso de poder aos presidentes da Câmara? A nova lei piora. O Presidente, que continua a ser apenas o primeiro da lista mais votada, tem poder absoluto sobre os vereadores da maioria. É ele que os escolhe. É dele que vão depender sempre. O lugar de vereador não lhes foi dado pelos eleitores, mas pelo presidente. São seus funcionários. Podiam até ser uma espécie de ministros. Mas para isso seria necessário um reforço real dos poderes da Assembleia Municipal (lá iremos) e assim não faria qualquer sentido que a oposição estivesse no executivo.

O sistema eleitoral actual é híbrido, mantendo oposição e governo no mesmo órgão executivo? Sim e a nova lei mantém isso mesmo, já que a oposição também terá os seus vereadores. A lei é completamente incoerente e é essa incoerência que denuncia os seus reais propósitos. Da mesma forma que presidencializa ainda mais as autarquias e que tenta sugerir que o executivo será semelhante ao que é hoje o governo nacional, mantém tudo como estava, apenas distorcendo a representação. A resposta tem sido que os poderes da Assembleia Municipal foram reforçados. É uma falácia. A Assembleia Municipal ganha um novo poder: aprovar o executivo proposto pelo Presidente. Pode chumba-lo por 3/5 dos deputados. Chumba uma vez e o presidente faz nova proposta. Chumba segunda e há eleições intercalares. Note-se que isto acontece apenas uma vez, logo no principio do mandato. Ou seja, o único poder real da Assembleia Municipal é, por decisão de 3/5 dos deputados municipais, provocar eleições antecipadas um mês depois das eleições. Um poder que, como é evidente, de tão absurdo, nunca será usado a não ser que 3/5 dos deputados entrem em delírio colectivo. Se o fizessem seriam justamente punidos pelos eleitores. O outro poder é o de impedir uma remodelação. Não é novo, porque antes o Presidente da Câmara não podia remodelar os vereadores que eram, como ele, eleitos.

Ou seja, a Assembleia Municipal tem uma bomba que não pode usar (e não tem direito a moção de censura) e a Câmara será refém do Presidente. Os vereadores que se demitam são substituidos, o que quer dizer que com a nova lei Carmona Rodrigues se manteria ainda hoje no lugar. Ou seja, não havendo até aqui, quase nunca, eleições intercalares, elas tornam-se impossíveis em caso de absoluta urgência.

Duas coisas apenas são positivas: presidentes de junta (que distorcem a representatividade na Assembleia Municipal) perdem direito de voto no Plano e no Orçamento e as eleições para os órgão autárquicos têm de ser simultâneas, não se repetindo o que aconteceu em Lisboa. Para estes dois pequenos pormenores não era precisa uma nova lei.

Resumindo: a lei é desnecessária, porque nenhum problema real tenta resolver, aumenta os poderes do presidente sem aumentar a estabilidade, reduz o papel da oposição e dá poderes apenas virtuais à Assembleia Municipal, afasta os vereadores dos eleitores, mata as oposições locais e é incoerente. Não é preciso fazer esforço nenhum para perceber qual o seu único real objectivo: forçar a bipolarização sem obrigar a coligações, livrar PS e PSD de oposições incómodas e sobre-representar estes partidos, tendo mais lugares para distribuir entre os dois.

Inquérito

Daniel Oliveira, 26.12.07
À pergunta "Concorda com a alteração da Lei Eleitoral Autárquica nos moldes que estão a ser negociados entre o PS e o PSD?" 225 leitores (73%) responderam que "não" e 82 (27%) disseram que "sim".

Novo inquérito na coluna da direita: "Qual a figura mais relevante de 2007?" Escolhi 10 políticos internacionais: Al Gore, Durão Barroso, George Bush, Hu Jintao, Hugo Chávez, Mahmoud Ahmadinejad, Nicolas Sarkozy, Robert Mogabe, Tony Blair e Vladimir Putin. Podia ter escolhido outros, mas estes parecem-me cobrir os principais acontecimentos políticos do ano. A ideia não é saber qual agrada ou desagrada mais aos leitores, mas apenas qual terá sido o que mais marcou o ano que agora acaba.

Este deve ser mais um oportunista que o partido tratou lealmente mas que está agarrado ao lugar

Daniel Oliveira, 12.12.07