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Arrastão: Os suspeitos do costume.

O pior dos tempos

Sérgio Lavos, 06.11.13

 

Através de meias palavras, ocultações e muita propaganda, o Governo vem dizendo ao que vem, ao que desde sempre veio: a destruição do Estado Social e a substituição deste modelo por uma sociedade, um novo Homem (à maneira das grandes revoluções totalitárias do passado), regido por valores como o materialismo, o individualismo e a caridade. Toda esta transformação beneficia uns poucos - a reforma do IRC, por exemplo, vai ajudar sobretudo as grandes empresas, deixando de fora e em desvantagem concorrencial as PME's - e perpetua clientelismos, amiguismos e a cultura do tacho, sobretudo em caso de posse do cartão dos dois partidos do Governo. Só assim se compreende que as despesas com os gabinetes ministeriais tenham aumentado, que o boys do PSD e do CDS neste momento ocupem a maioria dos cargos de nomeação política da administração pública, que milhares de assessores e adjuntos tenham sido arregimentados, vindos directamente da universidade de verão do PSD e dos meninos do Caldas, que várias figuras que diariamente regurgitam nas televisões a propaganda governamental estejam a ser recompensadas com cargos em empresas amigas - Arnaut, Catroga, etc. -, que na Saúde e na Educação se tenha vindo a cortar verbas para escolas, hospitais e centros de saúde públicos ao mesmo tempo que aumentam as transferências para hospitais em PPP e escolas com contrato de associação, e que se estejam a transferir recursos e a delegar competências nas IPSS's, reduzindo e estrangulando o financiamento à Segurança Social.

 

Os novos beneficiários deste Estado paralelo - como alguém já lhe chamou - aguardam pacientemente o que lhes vai calhar do pote. Basta ver a reportagem que a TVI24 passou anteontem à noite sobre as escolas particulares para percebermos como funciona o esquema. Nuno Crato em dois anos retirou às escolas públicas mais de 2 000 milhões de euros. Contudo, o orçamento de 2014 prevê um aumento no valor das transferências para escolas com contratos de associação, depois do mesmo ter acontecido nos dois anos anteriores. Como a reportagem mostra - e como toda a gente sabe -, estas escolas, na maior parte dos casos, recebem dinheiro indevidamente do Estado - a lei estipula que apenas deverão ser subsidiadas escolas em locais onde a rede nacional de escolas públicas não chegue. Na realidade, a maioria destas escolas tem ao lado oferta pública a funcionar muito abaixo das capacidades máximas e continuam a receber dinheiro. Não há melhor exemplo de mau gasto de dinheiro do Estado, com a duplicação de investimento na mesma área geográfica. Numa altura de "emergência nacional", como a direita não se cansa de repetir, há sempre dinheiro para ajudar o lucro privado. Nuno Crato ainda leva mais longe, e de forma despurada, o benefício de interesses privados, ao deixar cair, no novo estatuto das escolas com contrato de associação, a oferta de um serviço que o Estado não pode oferecer como condição para a atribuição dos subsídios. Enquanto as escolas públicas entram em declínio por falta de investimento e a qualidade de ensino cai drasticamente, todos nós, contribuintes, estamos a pagar às escolas privadas para que estas mantenham os seus lucros. Quando chegamos a um ponto em que o Estado transfere recursos dos impostos e corta em todo o tipo de prestações sociais e salários para que alguns possam continuar a manter o seu nível de vida, sabemos que este já não é um país democraticamente viável, é uma república das bananas governada como se fosse uma família de mafiosos, onde o Governo se limita a distribuir recursos por quem tem mais poder. E, ao mesmo tempo, são demonizadas as franjas da população mais desfavorecidas - os desempregados são parasitas, os pobres não querem trabalhar e a classe média é empobrecida sem dó nem piedade.

 

Mas todos os dias o pior que julgamos ter visto é ultrapassado por novos acontecimentos. Hoje, o ministro da Defesa, José Pedro Aguiar Branco, fala da "tentação de estado totalitário". Estará a falar do Estado criado pelo Governo a que pertence? É que ele refere-se a um estado que cria "dependências", "clientelas" e "promiscuidade". Ora, ainda há dias saiu uma notícia que demonstrava isto mesmo: este Governo bateu o recorde de gastos com escritórios de advogados, 33,3 milhões desde 2011, mais do que qualquer outro Governo antes. Depois de Pedro Passos Coelho ter prometido durante a campanha que o levou ao poder que iria preferencialmente recorrer à administração pública para este tipo de serviços, é obra. E mais obra é quando sabemos que o escritório a que Aguiar Branco pertence é dos mais favorecidos por este outsourcing criminoso. Não há limites para a falta de pudor destes governantes. Quando alguém que pertence a uma rede clientelar das mais favorecidas pelo Estado vem alertar para "promiscuidades", referindo-se ao Estado Social, atingimos níveis nunca antes vistos de pura canalhice. Esta gente vai ficar para a História do país, isso é certo. 

 

Adenda: sobre o factor cunha, leia-se este post, que relata a oferta de uma cunha a uma pessoa conhecida de Mário Crespo, feita em directo no Jornal da SIC-N pelo secretário de Estado do Emprego, Octávio Oliveira. Perderam mesmo toda a vergonha. E nós a vermos passar navios.

O Estado enquanto financiador do lucro privado

Sérgio Lavos, 05.09.13

Estado vai apoiar directamente alunos dos colégios, anuncia Crato.

 

Aqui está a concretização do golpe. O Estado (todos nós, contribuintes) vai passar a financiar apenas um grupo de privilegiados que anda em colégios privados e no ensino cooperativo. Note-se que não está previsto financiamento individual a quem anda no ensino público nem nada que se assemelhe ao cheque-ensino, que supostamente seria atribuído a todos os alunos, independentemente da sua origem, e que poderia ser usado no privado ou no público. Na prática, o Governo pretende entregar o nosso dinheiro directamente aos colégios particulares, estendendo a estes o actual modelo que beneficia o ensino cooperativo, financiando o lucro de privados (uma autêntica renda). Ao mesmo tempo, aprofunda a desigualdade já existente entre pobres e ricos, criando um ensino de primeira (alguém acha que os colégios privados vão passar a aceitar alunos de meios desfavorecidos?) e outro de segunda - as escolas públicas vão sendo cada vez mais depauperadas. Resumindo: corta-se no ensino público e entrega-se a poupança a mãos privadas. E ainda têm a pouca vergonha de chamar a isto "liberdade de escolha". Quem andou a lutar por um país mais livre e igual, mais democrático, vai certamente gostar desta coisa em que este Governo nos está a transformar.

Gozar com a nossa cara

Sérgio Lavos, 05.09.13

"Pedro Lomba Governo quer agência que atraia imigrantes e trave saída de jovens."

 

Isto é a sério? Que cretinice pegada. Primeiro mandam os jovens embora - e estes vão, sobretudo os mais qualificados -, depois querem criar uma agência que, para além de dar emprego a mais uns quantos boys dos dois partidos, tenha como objectivo atrair "cérebros" do estrangeiro, desse modo garantindo que os nossos também ficam por cá. Isto quando o financiamento à investigação caiu drasticamente e há cada vez menos incentivos para que os melhores em cada área continuem a trabalhar no país, levando a uma acelerada emigração daqueles que melhor podem contribuir para o nosso desenvolvimento. Pedro Lomba bem podia pintar a cara de preto com vergonha por ter-se metido nestas andanças e por continuar a fazer estas figuras. Ridículo.

O pior ainda está para vir

Sérgio Lavos, 31.08.13

Aqui está a jogada de Pedro Passos Coelho, em todo o seu esplendor: tentou fazer passar uma lei claramente inconstitucional (a requalificação dos funcionários públicos), para, depois de chumbada, vir pôr as culpas do segundo resgate - que está a ser preparado desde o início do ano, recorde-se - na lei e no Tribunal Constitucional. De uma penada, alivia as claras culpas do Governo e das políticas de austeridade neste segundo resgate e ameaça e amedronta os portugueses: "se não aceitarem as minhas condições - distorcendo a lei - vêm aí coisas ainda muito piores." Pedro Passos Coelho (com a ajuda preciosa de Cavaco Silva) é, neste momento, o maior perigo que a democracia conquistada no 25 de Abril já enfrentou.

A mentira como modo de vida

Sérgio Lavos, 28.08.13

Quando este Governo for varrido do país, serão descobertas as mentiras, manipulações e desvios que diariamente são escondidos dos portugueses. Algumas mentiras vão sendo conhecidas. Ontem, mais uma apareceu. Os números enviados pelo Governo para o FMI sobre cortes salariais foram falsificados. Com base nesses dados, o FMI elaborou gráficos e um relatório no qual defende que Portugal precisa de ajustar ainda mais os salários do privado. Os dados enviados ignoram milhares de casos presentes na amostra que serviu de base para a elaboração do relatório. Milhares de casos de salários que foram cortados, tanto no privado como no público. Até agora, o FMI não corrigiu o seu relatório nem a conclusão que retira. Desde que o relatório foi conhecido, por várias vezes Pedro Passos Coelho se pronunciou a favor da moderação salarial. Logo após o relatório ter sido conhecido, António Borges afirmou: "é urgente a baixa de salários". Só há duas razões para que os números passados ao FMI - em princípio, pelo ministro da Segurança Social, Pedro Mota Soares - sejam errados: por negligência, e nesse caso é grave porque evidencia uma incompetência que se tornou marca do Governo; ou pior, a omissão foi deliberada, e portanto houve dolo, um crime à luz da lei. Pelo historial de Pedro Passos Coelho e do Governo que o acompanha, inclino-me para a segunda. A distorção dos números serve na perfeição o programa ideológico do Governo. Pedro Passos Coelho não olha a meios para chegar aos fins. Se for preciso mentir, ele mente. Se for preciso manipular números, ele autoriza. A canalha que nos governa é assim. 

Porcos

Sérgio Lavos, 24.08.13

 

O PSD é um partido de tradições, fiel aos seus princípios, um partido que preza o seu passado e acarinha quem se acoita na sua asa. Os seus antigos líderes são donos de estações televisivas, comentaristas de sucesso ou anões para entreter a malta com prestidigitações que desviam a atenção dos crimes que o seu Governo está a cometer. Luís Filipe Menezes teve uma breve passagem pela cadeira do poder laranja, mas cedo regressou à sua toca em Gaia, empurrado pelos barões do partido e por cavaquistas que queriam experimentar com a Manuela Ferreira Leite que tinham à mão. A sua vigência antecipou o reinado de Passos Coelho em populismo, mentira e demagogia (e seguiu à letra as lições do seu mentor Pedro Santana Lopes). De volta à terrinha, continuou a endividar a autarquia de Vila Nova de Gaia, criando no povo um estado de permanente exaltação amorosa pelo líder, um feito a que apenas grandes estadistas - como Isaltino Morais, Moita Flores ou Fátima Felgueiras - podem aspirar. Este sublime estado de elevação espiritual leva a que todas malfeitorias associadas à podridão do poder autárquico - negociatas com empreiteiros, favorecimentos familiares, caciquismo - sejam não só perdoadas pelo povo como olhadas como o firme pilar do exercício do mandato autárquico. O povo vota em criminosos condenados e em populistas suspeitos precisamente porque confia na sua capacidade de ceder a todos os interesses - mais cedo ou mais tarde, o votante de Oeiras ou de Vila Nova de Gaia espera a autorizaçãozinha camarária para o acrescento à vivenda e é mais fáci esperar distorções à lei se o executivo camarário for naturalmente corrupto. No fundo, o povão vota em corruptos porque a corrupção é a sua verdadeira natureza - num país onde o Estado não funciona e não dá o exemplo, quem não o imita ou é anjo ou é parvo. Ou as duas coisas.

 

Ora, regressado Menezes ao remanso do lar, lá cumpriu o resto do mandato a que tinha direito. Mas o poder não é eterno, e com a lei de limitação dos mandatos o reinado de Menezes corria o risco de chegar definitivamente ao fim. Corria, mas acabou por não correr. O PSD, imbuído de grande sentido democrático, decidiu interpretar a lei à sua maneira, contradizendo o seu espírito, tal como ele é entendido pelo seu autor, por sinal um membro da família laranja, Paulo Rangel. Adiante, até porque quase todos os outros partidos dedidiram ler na lei o que muito bem entenderam, do PSD ao PCP, passando pelo CDS e pelo PS (a excepção é o BE). Empurrado por esta leitura elástica da legislação, Menezes dá um saltinho para o Porto. Abandona uma câmara depenada, das mais endividadas do país, mas nem por isso deixa de ter o apoio do seu partido - o PSD que no Governo está tão empenhado em lutar contra o despesismo. A pré-campanha tem sido um festival de promessas: desde um Porto capital do Norte de Portugal e da Galiza até um Oscar honorário para Manoel de Oliveira, Menezes tem-se desdobrado, tocando a todas as portas, visitando todas as capelinhas do populismo demagógico. Nada o pode parar - nem sequer a lei autárquica. Entre dois despachos na câmara de Vila Nova de Gaia, tem vindo a receber habitantes da cidade do Porto em dificuldades, a quem tem pago contas, facturas, rendas e o que aparecer. Diz-se mesmo que nas festas que tem dado já foram mortos mais de vinte porcos. Uma originalidade, que ultrapassa em muito os cheques passados pelo seu companheiro de partido Fernando Ruas ou os frigoríficos oferecidos em tempos por Valentim Loureiro. É fartar vilanagem. Só há um problema: é um crime comprar votos. E mesmo que os votos sejam comprados com porcos, não deixa de ser crime. Por isso, a Comissão Nacional de Eleições já veio enunciar claramente as ilegalidades que anda a praticar Menezes.

 

Sabemos que nada de sério ou relevante sairá daqui. A partir do momento em que um autarca continua a presidir à sua câmara a partir da prisão, tudo é possível. Sem ondas nem sobressaltos, ouviremos as desculpas de Menezes. O assunto trazer-lhe-á ainda mais visibilidade no Porto, e como o povão gosta de caciques, irá com certeza votar maioritariamente nele. Depois admiram-se do país ter chegado a este ponto. Os políticos são sempre, mas sempre, o espelho claro das pessoas que os elegem. Tão cedo não vamos sair da lama onde chafurdamos.

Bananas

Sérgio Lavos, 22.08.13

 

Este é um país definitivamente maravilhoso. No caso dos submarinos submergentes e emergentes, toda a gente minimamente relacionada com o negócio é indiciada por corrupção, menos o responsável final pela compra, o irrevogável Paulo Portas. Na Alemanha, a Ferrostal (empresa que vendeu os submarinos a Portugal) foi julgada por corrupção activa, tendo-se provado que pagou luvas a "desconhecidos" portugueses para que a compra dos submarinos fosse efectivada. Quem decidiu a compra foi Portas, mas ele continua por aí, com todo o sentido de Estado, como se nada fosse, e o seu nome nem sequer é referido na maior parte das notícias sobre o caso. Os telejornais ocupam metade do seu tempo com notícias sobre fogos e a outra metade com futilidades mais ou menos políticas, "esquecendo-se" de destacar um caso tão grave como este. Nada nos distingue de uma república das bananas. Continuemos a votar nos mesmos de sempre.

Timothy Leary não andou a investigar em vão

Sérgio Lavos, 07.08.13

Extra! Extra! Governo PSD/CDS acusa Governo CDS/PSD de forjar documento que mostra que secretário de Estado do Governo PSD/CDS tentou vender swaps crimininosos ao Governo PS! Ministério público investiga alegações, tendo revistado gabinete do primeiro-ministro, a origem do documento forjado que levou à demissão do secretário de Estado escolhido pelo primeiro-ministro para o Governo! Cavaco, enquanto anilha uma acção do BPN na casa da Coelha, diz que mantém a confiança total nesta tropa fandanga.

Coesão, estabilidade, seriedade

Sérgio Lavos, 07.08.13

 

Tem sido um fartote de estabilidade e coesão desde que o "novo Governo" tomou posse. O estado de "remodelação permanente", uma inovação conceptual deste Governo, está a dar os seus frutos. Desde ministros que se desirrevogam a secretários de Estado que ocupam o cargo durante pouco mais de um mês, tem havido de tudo. Há quem resista. Os melhores, os mais resilientes, são os que conseguem mentir com maior descaramento. Aquele briefing com Pedro Lomba e Joaquim Pais Jorge, um épico de vergonha alheia como há muito não se via, foi verdadeiramente assassino. A Pais Jorge, o vendedor de swaps criminosos, faltam a graça e o desplante de Maria Luís e de Passos Coelho. O seu problema não foi ter tentado vender um produto que mascarava a dívida pública. Nem sequer ter mentido. Foi ter mentido tão mal, tão atabalhoadamente, de forma tão incompetente, que não restou a Miss Swaps outra hipótese senão deixá-lo cair. Não sem antes encenar mais um golpe mediático, acusando a Visão e a SIC de terem forjado um documento - como se prova no vídeo acima, mais uma mentira forjada por Maria Luís. Entretanto, e para completar o ramalhete e colocar uma cereja em cima do pífio espectáculo que vem sendo encenado, o inefável Marco António Costa (em tempos delfim do presidente de uma das câmaras mais endividadas do país, Vila Nova de Gaia) veio acusar o governo de Sócrates de não ter mandado prender o secretário de estado nomeado pelo governo PSD/CDS e que tinha acabado de se demitir. Um primor de alta política, um cúmulo qualquer de desfaçatez, porventura inalcançável. Sócrates recusou a proposta do swap mas, claro, é o culpado pela nomeação de Pais Jorge, assim como pela nomeação do seu parceiro de venda, Gonçalo Martins Barata, para a administração das Águas de Portugal. É tão evidente, não é? Enquanto isso, o mentiroso mor, Passos Coelho, vai tomando uma prainha lá para os lados dos Algarves e Maria Luís vê os holofotes serem desviados durante algum tempo das suas próprias mentiras. Não duvidemos: é esta a estabilidade que Cavaco defende, em desfavor da democracia. Uma maravilha.