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Arrastão: Os suspeitos do costume.

Estado de Direito

Sérgio Lavos, 15.11.12

Menos de vinte e quatro horas depois, torna-se evidente que não só o Estado de Direito não foi respeitado pela PSP que atacou manifestantes indefesos, como sobretudo foi suspenso depois, quando a polícia se espalhou pelas ruas circundantes da Assembleia e começou a prender indiscriminadamente cidadãos, tivessem ou não estado presentes na manifestação. Mais de 100, de acordo com os relatos dos jornais e de activistas. O acesso a um advogado, obrigatório por lei, foi proibido pela polícia. O contacto com o exterior não foi permitido. E várias agressões policias tiveram lugar dentro das esquadras. Se isto não é uma grave ofensa ao Estado de direito, não sei o que possa ser. Não podemos aceitar métodos semelhantes às ditaduras sul-americanas, detenções ilegais e desaparecimentos de cidadãos inocentes que visam sobretudo a intimidação da população resistente. Que tanto Cavaco - responsável enquanto primeiro-ministro pelas cargas policiais mais violentas em democracia - como Passos Coelho - um perigoso arrivista - defendam a actuação da polícia não é surpreendente. É um sinal claro de que o o regime se prepara para estender o estado de emergência às liberdades cívicas fundamentais. Poderá haver muitos portugueses que concordem com esta suspensão da democracia. Mas os verdadeiros democratas não poderão pactuar com isto. Deixámos de ter soberania económica e financeira. Se abdicarmos da soberania política e democrática, colocamo-nos além de qualquer salvação. Este Governo e este presidente têm de ser parados porque são uma ameaça à democracia. Custe o que custar.

Violências

Sérgio Lavos, 14.11.12

A violência de 10 ou 20 pessoas na manifestação - estar uma hora a atirar pedras e garrafas é estúpido, desnecessário e contraproducente - não deve desculpar a extrema violência da polícia, agindo em matilha contra manifestantes pacíficos - a esmagadora maioria dos que se encontravam à frente da Assembleia. Agredir grávidas, mulheres e velhos não é "manter o estado de direito". É provocar o medo nos manifestantes de hoje e temor nas pessoas que poderão aparecer em futuros protestos. E tudo indica que o aumento anunciado ontem nos ordenados terá tudo a ver com esta mudança de atitude das forças policiais. Ficamos esclarecidos: a polícia existe para defender o Estado repressor, não os cidadãos que é suposto proteger. O relato de quem presenciou mais este acto de violência de Estado (encontrado no Facebook de Luís Varatojo):

 

"AQUILO QUE HOJE SE PASSOU, DO PONTO DE VISTA DE UM MANIFESTANTE PACÍFICO:
Para que não vinguem as mentiras da Administração Internas aqui têm o meu relato do que realmente se passou em frente à assembleia. 
Sim, é verdade que cerca de 20 a 30 pessoas passaram mais de uma hora a atirar petardos, pedras e garrafas à polícia. Por essa razão, os outros 99% de CIDADÃOS PACÍFICOS mantiveram a devida distância, para nem serem confundidos nem fazerem parte da acção de alguns animais. A certa altura, as pessoas perceberam que algo se estava a passar. Demasiadas movimentações de polícia na Assembleia demasiado organizadas.
Cá em baixo, numa das laterais um grupo de polícia à paisana abandona rapidamente a manifestação. Mais tarde, as televisões diriam que as pessoas foram avisadas para dispersar. Cá de baixo, posso-vos dar uma certeza, nenhuma pessoa com uma audição normal ouviu um único aviso.
A polícia disparou cerca de 4 a 6 petardos pela manifestação e carregou. Como estávamos todos bem afastados, os CIDADÃOS PACÍFICOS não fugiram. Mas quando vi um pai a fugir com o filho no colo e a levar bastonadas percebi que quem estava atrás das viseiras já não eram pessoas. 
Fugimos, mas por mais rápidos que tentássemos ser, eram pessoas a mais para conseguirem ser mais rápidas que a polícia. Felizmente não recebi carga, infelizmente porque atrás de mim tinha um escudo humano a tentar fugir. Ao meu lado, um senhor tentava fugir com a mulher de cerca de 50 anos, que chorava com a cara cheia de sangue. Não, esta senhora não levou com pedras dos manifestantes. Esta senhora estava cá atrás. Esta senhora levou com um cassetete.
Fugimos para uma rua afastada, onde pensávamos estar todos seguros e mostrar à polícia que não queríamos estar na confusão, nós os CIDADÃOS PACÍFICOS. Nada nos valeu, pois a polícia perseguiu as pessoas pelas várias ruas em redor da Assembleia, carregando em todos. O que me safou foi uma porta aberta de um prédio, onde me refugiei com mais 8 CIDADÃOS, incluindo jornalistas da Lusa. O que lá fora se passava era incrível. Uma senhora de idade que chegava a casa tentava entrar no seu prédio mas a polícia gritava-lhe para que descesse a rua. 
Só mais de 30 minutos depois conseguimos sair e o que mais me impressionou foi a quantidade de sangue que havia pelos passeios, bem longe da Assembleia.
NÃO ACREDITEM EM MENTIRAS. ERA POSSÍVEL NÃO TER PERSEGUIDOS CIDADÃOS PACÍFICOS QUE FUGIAM POR RUAS AFASTADAS MAIS DE 200 METROS DA ASSEMBLEIA.
Mesmo quando estava “barricado” no prédio, mesmo com a porta fechada tive, pela primeira vez, muito medo da polícia.
O que sinto agora não é nem raiva, nem revolta. É um vergonha enorme e uma imensa e profunda TRISTEZA.
É assim que se tira a vontade ao povo civilizado de se manifestar. Tira-se-lhe a esperança."

O estado austeritário

Sérgio Lavos, 26.09.12

 

Em Espanha e na Grécia as botas cardadas do austeritarismo são calçadas pela polícia, sendo cada vez mais evidente que a receita apenas conseguirá ser aplicada recorrendo-se à violência de Estado e distorcendo-se os valores democráticos - nenhum povo pode aguentar durante muito tempo um alto nível de desemprego e o empobrecimento generalizado sem se revoltar. 

 

*A foto mostra o responsável de um bar da área onde aconteceu a manifestação de ontem impedindo que a polícia entrasse atrás de manifestantes. Votante do PP, indignou-se com o total descontrolo dos agentes.

O estranho caso da realidade que não respeita a ficção escrita pela polícia

Sérgio Lavos, 21.06.12

 

Rui Rio, conhecido como "O Entaipador Implacável da Ribeira", decidiu uma vez mais enviar os gorilas da polícia municipal para vandalizarem um projecto cidadão que tinha ocupado um espaço público deixado ao abandono, no caso a biblioteca infantil Ivo Cruz. Não devemos duvidar: Rui Rio prefere o vazio à cultura, a violência institucional à participação cidadã na construção da cidade do Porto. Como vi escrito no Facebook, assim que Rio ouve falar em cultura, saca dos tapumes. Modos de vida. Mas não é isso o mais intrigante neste caso de assoberbamento cro-magnon do presidente da câmara portuense.

 

No dia em que a biblioteca foi assaltada pela polícia, o Diário de Notícias noticiou o caso. O bizarro da situação é que o jornal saiu para as bancas cerca de três horas antes do caso ter acontecido. A notícia - sem assinatura - falava em "injúrias e agressões a agentes", quantifica o número de pessoas identificadas e especula sobre a origem dos ocupantes do espaço. Este extraordinário exercício da adivinhação dado à estampa no Diário de Notícias teve pouca repercussão na realidade; a efectiva vandalização do espaço pela polícia, acontecida três horas depois desta notícia ter começado a ser lida, acabou por decorrer sem "injúrias e agressões" nem outros fenómenos paranormais de monta.

 

Contactado pela associação que ocupara o espaço, o provedor do DN defendeu o jornal dizendo que a notíciaa tinha sido escrita com base num comunicado da polícia enviado na noite anterior. Fantástico país, este, em que membros da polícia se dedicam a escrever notícias que depois enviam aos jornais, e ainda por cima notícias sobre o futuro, sobre o que ainda está para acontecer. Fabulosa nação, também, aquela em que um jornal - por sinal, o mais antigo publicado em Portugal - recebe notícias redigidas pela polícia e as publica como sendo suas e verdadeiras.

 

Contado não se acredita, dirão. Mas eu acrescento: a verdade e a realidade, tudo vão, tudo ilusório. Acreditamos no que queremos acreditar, mesmo que seja má ficção escrita por um péssimo polícia.

 

Adenda: o provedor do jornal, Óscar Mascarenhas, deixou na caixa de comentários um esclarecimento sobre a sua actuação que julgo ser premente deixar aqui. Diga-se que nunca duvidei da competência de Óscar Mascarenhas, que tem mostrado, em outras situações ocorridas no DN - por exemplo, o caso da contra-notícia enviada pelo Governo para a redacção no dia de uma greve de transportes - bastante competência e sobretudo independência nas suas análises, nunca se furtando a criticar e a melhorar os procedimentos do jornal para o qual trabalha.  Aqui fia então, com um pedido de desculpas pelo equívoco cometido:

"Caro Sérgio Lavos:
Não fui contactado pela associação nem defendi coisa nenhuma. Já esclareci no blogue respetivo e repito-o aqui:
Pretendo retificar aqui um equívoco. "O provedor do leitor deste jornal foi contactado, e defendeu que aquela peça foi baseada num comunicado da polícia enviado na noite anterior". Esta afirmação não corresponde à verdade. A Sra. Patrícia Dias da Silva contactou-me (sem me dizer se representa ou não mais alguém, mas isso é indiferente) e respondi-lhe: "Já recebi uma reclamação anterior sobre esta notícia e pedi esclarecimentos urgentes à Direção do DN, sendo certo que a notícia parece sustentar-se em informações fornecidas por forças policiais.
Obrigado pelo alerta." Não "defendi" coisa nenhuma, prometi averiguar e bem dispensava que a minha resposta fosse tão completamente deturpada. A análise do que aconteceu sairá na edição de amanhã, dia 23, do DN. Oscar Mascarenhas (Provedor do Leitor do DN).

A subversão do sistema

Sérgio Lavos, 30.04.12

 

Duas pessoas decidem juntar-se à porta de um lugar público frequentado a distribuir folhetos. As pessoas passam, umas aceitam, outras recusam, algumas não chegam a parar. Se os folhetos forem de publicidade a uma cadeia de supermercados ou a uma loja de uma marca de luxo, essas duas pessoas poderão distribuir até ao fim a sua publicidade. O mesmo acontecerá com os distribuidores de jornais gratuitos, no meio do trânsito ou na rua. Se essas duas pessoas forem distribuir esses folhetos publicitários em frente a um Centro de Emprego, poderão fazê-lo à vontade, ninguém as incomodará. Mas se essas duas pessoas estiverem a distribuir folhetos com informação ao desempregados que entram e saem do Centro, informação sobre os seus direitos, sobre a melhor forma de se organizarem, então correrão o risco de serem identificadas pela polícia (que todos nós pagamos) e serem levadas a tribunal pelo crime de "manifestação sem a devida autorização". Isto aconteceu em Portugal, no dia 26 de Abril de 2012. A comissária Carla Duarte, porta-voz da PSP, veio dizer que um ajuntamento de duas ou mais pessoas já pode ser considerado uma manifestação. Trinta e oito anos depois de uma ditadura que proibia "ajuntamentos" por serem subversivos. Bem sabemos que à polícia muitas vezes falta bom-senso e, sobretudo, conhecimento da Constituição que é suposto defender. Mas este caso, que se soma a tantos outros acontecidos nos últimos meses, é mais um sinal de que alguma coisa insidiosamente preocupante começa a emergir neste país em plena suspensão da democracia. Porque o vulgar polícia de rua não aje desta maneira se não tiver as chefias do seu lado. E no topo da hierarquia está, uma vez mais, o ministério da Administração Interna, o único cujo orçamento foi reforçado para este ano. Miguel Macedo e o Governo PSD/CDS a que pertence sabem muito bem o que estão a fazer. Se isto não é gravíssimo e inadmissível, então começo seriamente a pensar que o limiar da decência há muito foi ultrapassado.

A ordem da desordem

Miguel Cardina, 23.04.12

O DN de hoje informa na primeira página que "a PSP prepara tolerância zero nas manif's do 25 de Abril" (e do 1º de Maio), fazendo-se referência aos incidentes de 22 de Março. Se tivermos na mente o que então se passou - a intervenção policial desmesurada e as tentativas posteriores de branqueamento informativo, paulatinamente desmontadas na rede e em alguma comunicação social - torna-se clara a receita engendrada pela "ordem da desordem": insuflar o medo, iniciar a provocação, justificar antecipadamente a violência.

CGTP

Sérgio Lavos, 24.03.12

Ainda estou para ouvir as explicações de Arménio Carlos e da CGTP sobre a agressão por sindicalistas ao grupo dos Precários Inflexíveis na chegada à Assembleia. E já agora também gostaria de saber o porquê da demarcação que o líder da intersindical fez das outras manifestações do dia da Greve. Se as agressões policiais e as declarações sucessivas da direcção da PSP e de Miguel Macedo são expectáveis - ninguém espera de gente com tendências salazarentas que algum dia consiga ser sincera ou que tenha vergonha na cara - da CGTP eu - e muitos outros - esperaria um repúdio claro das declarações do MAI e da violência da PSP*. Até agora, nada. Triste, e a confirmação de que CGTP é, cada vez mais, parte do problema e não da solução. A intersindical caminha a passos largos para se tornar o rosto da institucionalização da contestação. Mais importante que os direitos dos trabalhadores ou a miséria dos desempregados parece ser a posição de demarcação dos movimentos sociais que foram aparecendo. Quando uma intersindical esquece desta maneira os direitos dos mais desprotegidos e dos trabalhadores que é suposto defender, quem ganha será sempre quem detém o poder, quem está a destruir o país. Enquanto sindicalizado num sindicato que pertence à CGTP, sinto-me muito pouco representado. E, sobretudo, revoltado. O silêncio da CGTP é ensurdecedor. E inadmissível.

 

*O Pedro Viana tem razão: a CGTP não se incomoda com os elogios de um proto-salazarista como Miguel Macedo?

De 1962 a 2012

Miguel Cardina, 24.03.12

Os participantes hoje na comemoração dos cinquenta anos do início em Lisboa da "crise de 62" aprovaram um texto onde manifestam preocupação sobre a actuação desproporcionada da polícia na passada quinta-feira. Como se diz no texto, disponibilizado pela Joana Lopes, «os jovens de 1962 não podem tolerar em democracia o que repudiavam em ditadura.» Segue a moção na íntegra:

 

MOÇÃO
Há 50 anos, a indignação perante uma carga policial sobre estudantes que pretendiam comemorar o Dia do Estudante deu origem ao luto académico que hoje aqui evocamos. 
Há dois dias, vimos nas televisões as imagens de polícias carregando de novo sobre jovens, com uma violência desmedida e desproporcionada. Mais vimos o espancamento de jornalistas, pondo em risco a isenta cobertura da carga policial. 
Os jovens de 1962 não podem tolerar em democracia o que repudiavam em ditadura. Assim, os participantes na Crise Académica de 1962, reunidos na Cantina da Cidade Universitária em 24 de Março de 2012, decidem: 
- Manifestar o seu repúdio pelos actos de violência policial verificados em Lisboa e no Porto a 22 de Março de 2012; 
- Dar conhecimento desse repúdio a Suas Excelências o Presidente da República, a Presidente da Assembleia da República, o Primeiro-Ministro; o Ministro da Administração Interna, o Inspector-Geral da Administração Interno e o Sr. Provedor de Justiça, assim como aos órgãos de Comunicação Social. 
Cantina da Cidade Universitária 
24 de Março de 2012

Obviamente, demita-se

Sérgio Lavos, 24.03.12

 

“na greve de 24 de Novembro detivemos um homem que estava a dar pontapés nas grades frente à Assembleia da República, mas quando já estava algemado disse que pertencia às brigadas de investigação criminal da PSP”

 

O ministro Miguel Macedo sempre negou que estivessem agentes provocadores na manifestação de 24 de Novembro. Os testemunhos de quem lá esteve sempre afirmaram o contrário. Os agentes provocadores não são admissíveis por lei, e são também um sinal claro de que a violência durante as manifestações interessa muito mais ao Governo do que aos manifestantes, que estão ali apenas a protestar - mesmo que haja alguém mais exaltado. Se esta revelação - a que se acrescenta a confirmação de que a ordem para os polícias agressores veio de cima -, feita por uma fonte do corpo de intervenção da PSP, não é grave, não sei o que poderá ser. Afinal, este é ainda um Estado de direito, ou não? A Miguel Macedo, depois das contradições, das mentiras e depois do que aconteceu na quinta-feira - manifestantes e jornalistas agredidos com uma brutalidade de cão danado - apenas resta um caminho: o da saída. Obviamente, demita-se.